“Desse governo nada mais me assusta”. Um dia depois de fazer esse comentário direcionado ao governador do Amazonas, José Melo (Pros), o jornalista Clayton Pascarelli foi demitido da Rede Amazônica, afiliada da TV Globo em boa parte da região Norte do país. A frase foi ao ar durante a edição de terça-feira, 3, do ‘Bom Dia Amazônia’. Na manhã de quarta, 4, já sem apresentar o noticiário que comandava desde janeiro de 2013, o comunicador recebeu a notícia de que estava fora dos planos da emissora.
Horas depois de ser comunicado de que não era mais funcionário da empresa de mídia, Pascarelli usou a fan page que administra para comentar a oportunidade de trabalho que durou 11 anos, com ele começando como estagiário e passando pelas funções de produtor e repórter antes de se tornar um dos âncoras do canal. Em seu post, o jornalista pontua que sempre teve a emissora como a sua casa e fez questão de agradecer aos fundadores da emissora: Milton Cordeiro e Phelippe Daou, que morreram em 2016. “Agradeço imensamente […] pela isenção, credibilidade e liberdade que me deram”.
Em seu posicionamento a respeito da saída da Rede Amazônica, o jornalista não cita a possibilidade de a demissão ter algum tipo de ligação com o comentário feito ao vivo. A relação da frase dita na terça com a dispensa foi levantada primeiramente pelo site Parintins 24 horas, que chegou a repercutir que o público usou as redes sociais para demonstrar apoio ao profissional que perdeu o emprego – o nome do comunicador chegou a ocupar os trending topics, lista dos termos mais comentados no Twitter.
Funcionários da empresa manauara ouvidos pelo Portal Comunique-se reforçam a ideia de que a decisão de demitir Pascarelli tem a ver com a frase soltada durante o ‘Bom Dia Amazônia’. Os profissionais que conversaram com a reportagem – e que por razões óbvias pediram para que seus nomes não fossem divulgados – relataram que o diretor e um dos sócios da Rede Amazônica, Aluísio Daou, chegou à redação gritando que seu telefone não parava de tocar “por causa do comentário do apresentador”, disse uma das fontes que garante ter presenciado a cena.
Com a história, a reportagem do Portal Comunique-se tentou falar com o diretor de jornalismo da Rede Amazônica, Luís Augusto Pires Batista, mas foi avisado que ele está de férias. Por e-mail, a gerente de jornalismo do canal, Ercilene Oliveira, informou que a empresa ainda “irá se pronunciar oficialmente sobre o assunto”. No contato eletrônico, a reportagem questiona os motivos que levaram a emissora a demitir o jornalista e se tal decisão tem a ver com o comentário disparado contra o governo amazonense.
Demitido pode virar concorrente
Formado em comunicação social e pós-graduado em jornalismo investigativo pela ESPM do Rio de Janeiro, Pascarelli estava na Rede Amazônica desde 2006. Agora, fora da afiliada da Globo, ele pode acabar por se tornar um concorrente direto da emissora. Informações dão conta que o comunicador já recebeu proposta da TV A Crítica, afiliada da Record que tem planos de dar a ele o comando da nova versão local do ‘Cidade Alerta’, que está para ser implementada. Ainda sem acertar seu futuro na imprensa, o apresentador segue como conselheiro fiscal da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).
Manaus em pauta pelo mundo
A demissão de Pascarelli acontece na semana em que o governo comandado por José Melo se vê em meio à matança propagada por facções nos presídios do estado. A guerra prisional entre a Família do Norte (FDN) e o Primeiro Comando da Capital (PCC) tem chamado a atenção da imprensa nacional, que tem enviado equipes para Manaus, e até da mídia estrangeira, que, conforme o Portal Comunique-se registrou ao reproduzir notícia da Agência Brasil, repercutiram o caso que resultou em mais de 60 detentos assassinados.