São Paulo, SP 28/10/2021 – O 1º fator de sofrimento nas empresas são relacionamentos. Se a pessoa tem um líder autoritário, que estabelece metas impossíveis, está mais propensa a adoecer
Uma pesquisa realizada pela empresa de recrutamento e seleção Kenoby mostra que o tema saúde mental ainda precisa avançar no meio corporativo. Em um levantamento com 488 profissionais de RH de grandes empresas brasileiras, no início deste ano, 60% afirmaram que contratar uma pessoa ou criar um departamento de saúde mental é prioridade para a empresa. Mas 53% não sabem dizer quando isso será feito.
Se companhias estão tão interessadas no ESG, não há por que não acelerar essa mudança. “Hoje é comum as empresas prestarem contas sobre preservação ambiental, mas se esquecerem da sustentabilidade humana”, destaca Ana Léria, especialista em psicologia positiva e comunicação, fundadora da Posithiva, consultoria de cultura organizacional humana e sustentável.
A pandemia tornou ainda mais urgente o debate sobre saúde mental nas empresas. O burnout ganhou especial evidência, diante do aumento no número de casos no país e no mundo. As respostas das companhias são diversas: vão de estabelecer dias livres de reuniões até oferecer assistência psicológica. Mas uma postura ainda aparece pouco na agenda corporativa, segundo especialistas. É preciso trabalhar mais na prevenção do problema do que em ações paliativas.
No contexto profissional, isso significa, primeiramente, cuidar do ambiente e das condições de trabalho dos funcionários. O estilo de gestão da liderança é determinante para o bem-estar dos profissionais, diz Ana Léria.
“O fator número um de sofrimento nas empresas são os relacionamentos. Se a pessoa tem um líder autoritário, que pressiona e estabelece metas impossíveis, está mais propensa a adoecer”, explica ela. Em um cenário como esse, atividades de descompressão não são suficientes. “Bons ambientes e relações de colaboração e confiança são alguns dos fatores que influenciam o bem-estar de maneira mais profunda”, ressalta Ana Léria.
A carga de trabalho também tem um peso significativo. Esse foi mais um fator agravado pela pandemia e, em muitos casos, pelo trabalho remoto e suas circunstâncias. Na migração para esse modelo, o excesso de reuniões virtuais se tornou um problema comum.
Em uma pesquisa realizada pela Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP) e pela Fundação Instituto de Administração (FIA), 45% dos entrevistados disseram estar trabalhando mais de 45 horas por semana desde que entraram em home office. Uma parcela de 23% disse trabalhar entre 49 e 70 horas por semana, enquanto 6% ultrapassam 70 horas semanais.
Um levantamento da startup Fhinck também identificou essa tendência. A empresa disponibiliza um software que ajuda empresas a otimizarem processos e tarefas entre os funcionários. No último ano, identificou um aumento médio de 12% na jornada de trabalho dos mais de 12 mil profissionais que utilizam a ferramenta. Uma parcela de 7% deles, em média, manteve jornadas de 60 horas ou mais no período. Diante do cenário, a startup passou a alertar as companhias sobre os riscos de burnout.
Desempenhar atividades repetitivas por longos períodos, manter horários irregulares de almoço (ou não efetuar essa pausa) e não ter um descanso mínimo de 11 horas entre as jornadas são alguns fatores considerados de alerta.
Nem tudo é sobre burnout
O aumento na incidência da síndrome de burnout é um alerta importante e urgente para empregadores. Mas garantir o bem-estar dos funcionários começa muito antes (e vai muito além) de evitar o seu esgotamento. Também não se trata de oferecer benefícios pontuais e isolados.
“Quando se fala de colaboradores felizes, empresas pensam em mesas de bilhar, premiações, euforia. Mas a felicidade plena e autêntica não vem dos momentos de prazer ou descompressão. Vem das ações que promovem o bem-estar subjetivo das pessoas”, diz Ana Léria.
Colaboração, autonomia e feedbacks são alguns fatores que colaboram com esse objetivo, segundo a psicóloga. Capacitar os funcionários, garantindo sua aptidão para exercer suas atividades, também é considerado um fator determinante para o bem-estar no trabalho. Tarefas burocráticas, falta de autonomia e microgerenciamento, ao contrário, têm efeito negativo na satisfação e no desempenho. Por esse e outros motivos, a abordagem sobre saúde mental não deve ser tratada como uma responsabilidade exclusiva do departamento de RH. Cabe à área, sobretudo, preparar a liderança para fazer uma gestão adequada.
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