São Paulo 14/2/2022 – É possível aumentar os índices de cura se os recursos forem direcionados para o diagnóstico precoce e assertivo e o encaminhamento ao tratamento adequado
Na semana do Dia Internacional do Combate ao Câncer Infantil (15 de fevereiro), Sidnei Epelman, oncologista pediatra, fala sobre as principais frentes para se elevar os índices de sobrevida e cura do câncer infantojuvenil no Brasil
Assim como em países desenvolvidos, no Brasil o câncer já representa a primeira causa de morte (8% do total) por doença entre crianças e adolescentes de 1 a 19 anos. O Instituto Nacional de Câncer (INCA) estima que, para cada ano do triênio 2020/2022, sejam diagnosticados no país 8.460 novos casos entre crianças e adolescentes – 4310 em meninos e 4150 em meninas. Nos Estados Unidos, a expectativa é de 10.500 novos casos em 2021.
Os tumores mais frequentes na infância e na adolescência são as leucemias, os que atingem o sistema nervoso central e os linfomas. Também acometem crianças e adolescentes o neuroblastoma (sistema nervoso periférico), o tumor de Wilms (rins), o retinoblastoma (tumor ocular), o tumor germinativo (das células que originam os ovários e os testículos), o osteossarcoma (ossos) e os sarcomas (tumores de partes moles).
Graças aos avanços no diagnóstico e tratamento nas últimas quatro décadas, hoje cerca de 80% das crianças e adolescentes afetados por câncer podem ser curados, se diagnosticados precocemente e tratados em centros especializados.
De maneira geral, esse é um aumento considerável, quando se pensa que em meados da década de 1970, a taxa de sobrevida em cinco anos era de apenas 58%. Tal melhora, no entanto, não é uma realidade na maioria dos países de baixa e média renda onde, de acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), tal taxa é de aproximadamente 20%. E onde, de maneira geral, as condições econômicas limitam o acesso a profissionais, sistemas e tecnologias compatíveis com os mais atualizados recursos para o diagnóstico e o tratamento do câncer.
Estudo realizado em 2021 mostrou que no Brasil as taxas de mortalidade por câncer infantil são em média o dobro dos Estados Unidos, a despeito de os índices de novos casos por ano serem muito semelhantes nos dois países – 8 mil e 10 mil, aproximadamente. E ainda há no país enormes desigualdades regionais, com concentração de altos índices de cura – acima de 80% – na região Sudeste.
Visão de especialista
Sidnei Epelman, oncologista pediatra, é Diretor do Serviço de Oncologia Pediátrica do Hospital Santa Marcelina, na zona leste de São Paulo, e Presidente da Associação para Crianças e Adolescentes com Câncer TUCCA. O Hospital Santa Marcelina é uma referência no tratamento de crianças e adolescentes com câncer e conta com a parceria da TUCCA.
Epelman fala sobre as principais frentes para se ampliar os índices de sobrevida e cura do câncer infantojuvenil no Brasil.
Como é possível aumentar os índices de sobrevida e cura do câncer infantojuvenil em todo o Brasil?
Dr. Epelman – É preciso promover uma espécie de proliferação dos pensamentos que regem os centros de maior sucesso. Pois é, sim, possível chegar a altos índices, se os recursos forem direcionados para as ações prioritárias para o diagnóstico precoce e assertivo e o encaminhamento correto para o tratamento adequado e atualizado do câncer infantojuvenil.
Qual a primeira preocupação que se deve ter em relação ao diagnóstico do câncer infantojuvenil?
Dr. Epelman – Acesso ao diagnóstico precoce, correto e assertivo. Em primeiro lugar, são de suma importância as campanhas elucidativas para que pais, professores, profissionais de saúde e outros adultos identifiquem os primeiros sinais e sintomas e procurem um atendimento médico o mais rápido possível em casos de suspeita de câncer infantojuvenil. Em seguida, é necessário que os serviços estejam qualificados à luz do conhecimento atual para chegarem ao diagnóstico assertivo.
E quanto aos médicos?
Dr. Epelman – É preciso capacitar médicos de várias áreas. Não apenas os especialistas alocados nos centros especializados, mas também os pediatras e outros profissionais de saúde, que atuam no atendimento primário. Eles devem ser orientados sobre os sinais e sintomas que podem indicar a presença de um câncer na criança ou adolescente. Quanto mais rapidamente os sintomas forem identificados, maiores as chances de cura.
Como estamos no Brasil quanto ao tratamento adequado ao câncer infantojuvenil?
Dr. Epelman – Atualmente, poucos centros habilitados de oncologia pediátrica têm acesso aos anticorpos monoclonais, imunológicos quimioterápicos que fazem parte do novo arsenal terapêutico da oncologia personalizada. O acesso à terapia imunológica é uma estratégia fundamental para aumentar as chances de cura de pacientes com câncer. O desafio é que o acesso seja universalizado em todas as regiões e centros públicos de atenção à criança e adolescente com câncer do país.
E quanto a investimentos em pesquisa?
Dr. Epelman – Uma das áreas fundamentais para se investir é a de pesquisa em patologia e biologia molecular. Alguns tipos de tumores mais comuns na infância e adolescência, como os tumores cerebrais, entre eles o meduloblastoma, podem ser melhor diagnosticados a partir de uma análise morfológica e molecular. Tal análise permite oferecer tratamentos individualizados, mais eficazes, menos tóxicos e de menor custo.
Quais as principais peculiaridades do tratamento do câncer em crianças e adolescentes?
Dr. Epelman – A prática da oncologia pediátrica mostra que o tratamento de câncer deve levar em conta as peculiaridades do (a) paciente. Não apenas em função das características patológicas, mas também levando-se em consideração os aspectos emocionais, psicológicos e até socioeconômicos e de nível de escolaridade familiar. Assim, os centros especializados devem atuar sempre pensando em todo o entorno da criança, do adolescente – e de seus familiares -, com equipes multidisciplinares, que incluem também psicólogos, assistentes sociais, fisioterapeutas e outras especialidades.
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