Cerca de 47% dos médicos que atuam no estado de São Paulo estão concentrados na capital. Os dados são do estudo Demografia Médica 2024, do Conselho Federal de Medicina (CFM). Enquanto somente a cidade de São Paulo reúne 77,8 mil profissionais, os outros 644 municípios somam 88,6 mil. A má distribuição também está evidenciada no Painel da Educação Médica. Segundo a plataforma de dados elaborada pela Associação dos Mantenedores Independentes Educadores do Ensino Superior (AMIES) em parceria com o portal Melhores Escolas Médicas, 65,58% das cidades paulistas têm coeficiente de até 1,7 médico por mil habitantes, número equivalente a 45% do índice de referência da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que é de 3,7 médicos/mil habitantes.
A metodologia para o cálculo de médicos por mil habitantes utilizada no Painel da Educação Médica considera o somatório das cargas horárias registradas no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNS) e o número de profissionais classificados na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO). A plataforma também mostra que somente 5,74% dos municípios paulistas têm o coeficiente de médicos superior ao que preconiza a OCDE. As cidades mais afastadas da região metropolitana são as que mais sofrem com a carência de profissionais. Enquanto São Caetano do Sul, no Grande ABC, possui 165.655 habitantes e um coeficiente de 8,4 médicos por mil habitantes, Pedra Bela, pequeno município do nordeste do estado, com 6.667 moradores, registra um coeficiente de 0,17.
Em linhas gerais, o Conselho Regional de Medicina de São Paulo calcula um aumento de 56% no número de médicos no estado, nos últimos 13 anos. No entanto, o presidente do Cremesp, Angelo Vattimo, pondera que esta evolução “não reflete em capacitação para o atendimento à população, devido à abertura indiscriminada de escolas médicas, que não possuem a estrutura necessária, priorizando os interesses econômicos”.
Médico e professor universitário, o doutor em Educação Alcindo Ferla discorda do argumento da falta de estrutura como forma de barrar a criação de novas vagas de Medicina. “A ausência de leitos hospitalares, por exemplo, é um problema do sistema de saúde, que tem a responsabilidade de implementá-los, e não do sistema educacional. Mas este é o discurso que vem sendo usado há quatro décadas e que, portanto, desconsidera a evolução do sistema de saúde em todo este tempo. Outros serviços são mais relevantes para formar competências, como o mecanismo de internação domiciliar”, comenta.
De acordo com Painel da Educação Médica, São Paulo conta com 74 graduações em Medicina, entre públicas e privadas. Elas somam 12.572 vagas e representam 12,4% de todas as ofertas do país. As instituições particulares são responsáveis por 88,2% dos cursos avaliados pelo MEC como de excelência em qualidade. Conforme o Cadastro Nacional de Cursos e Instituições de Educação Superior (e-mec), são 15 graduações com Conceito de Curso 5, nota máxima, e apenas dois da rede pública.
Porém, apesar de apresentar resultados expressivos em relação à qualidade, a rede privada ainda luta para ampliar a atuação. Conforme levantamento feito pela AMIES, existem 294 processos em trâmite no país para autorização, credenciamento e aumento de vagas em Medicina. Deste total, 45 são referentes ao estado de São Paulo.
Enquanto a discussão sobre a ampliação de vagas se dá no terreno da justiça, a lei da oferta e procura contribui para inflacionar a formação médica na rede privada. Segundo levantamento de O Globo, cinco das dez faculdades de Medicina mais caras do país estão em São Paulo. No topo do ranking, a Faculdade São Leopoldo Mandic cobra a mensalidade de R$ 12,1 mil. Ou seja, por mês, um aluno de Medicina paga quase 15 cestas básicas somente em mensalidade, fora materiais escolares, dentre outros custos.
Distribuição de especialistas
A distribuição desigual em São Paulo também fica evidenciada entre os médicos especializados. São 43,5 mil especialistas na capital e 43,3 mil no interior do estado. Essa carência é grave em áreas de especialidade médica cruciais para a população. Por exemplo, São Paulo é um estado que está envelhecendo mais rapidamente do que a média nacional, com 66 idosos para cada 100 crianças, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mesmo assim, conta com apenas 1,2 mil médicos geriatras, o que corresponde a um coeficiente extremamente baixo de 0,03 especialistas por mil habitantes.
Outro exemplo significativo da falta de especialistas está na área de cirurgia pediátrica. O coeficiente de apenas 0,02 cirurgiões pediátricos por mil habitantes indica que muitas crianças no estado de São Paulo têm acesso limitado a cuidados cirúrgicos adequados. A situação se repete em outras especialidades essenciais, como a pneumologia, vital para o tratamento de doenças respiratórias. Dados do DataSUS, o sistema de informações do Ministério da Saúde, indicam que 28% das mortes em São Paulo são causadas por doenças do aparelho respiratório, mas a média de médicos pneumologistas é de apenas 0,03 por mil habitantes.
Diante do cenário de escassez de especialistas, conforme dados do Painel da Educação Médica, São Paulo possui 22.589 vagas autorizadas para residência médica, das quais, 15.999 estão efetivamente ocupadas. A taxa de ocupação no estado é de 70%. Somente a capital concentra 10.404 vagas autorizadas (46% do total) e 7.828 ocupadas (49%). Já os municípios do interior somam 4.014 ou 60% das 6.590 vagas ociosas.
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