Bolsonaro, na sexta da semana passada, concedeu doze aeroportos. Há investidores, portanto, acreditando que não haverá mudança nas regras do jogo e que suas apostas são seguras, poderão dar lucro. Disse o presidente que seu governo “está recuperando a confiança do país”. É aí que se engana: embora, em pouco menos de nove meses, tenha adotado boas medidas, que agradaram o mercado, o grande problema de seu governo é a desconfiança de que é alvo.
Não sou bolsonarista, nem petista, nem comunista. Sou jornalista. Quem quiser xingar que xingue, mas o jornalismo é crítico e desconhece aliados.
Bolsonaro obteve a reforma da Previdência, que em algum tempo irá aliviar o déficit fiscal, o Congresso deve fazer a reforma tributária, e com apoio dos governadores (a nova distribuição de impostos pode prejudicar alguns Estados), os juros oficiais jamais estiveram tão baixos, o que também irá contribuir para aliviar o déficit, o tratado União Europeia-Mercosul, que levou 20 anos de negociação, foi assinado (ainda falta que os parlamentos o aprovem), a BR, distribuidora da Petrobras, sai do colo estatal.
O quadro é bom – mas o líder da oposição é o aguerrido Jair Bolsonaro. Seus rompantes ganham mais destaque do que suas conquistas. O Brasil nada ganha quando o presidente e o cordão que cada vez aumenta mais dizem que a mulher de Macron é feia, ou que nazismo é de esquerda. O Governo tem aspectos positivos, não só negativos, mas a imagem é ruim. E imagem é o que se vê.
Leia jornais e revistas europeus: Bolsonaro é fascista, inimigo do meio-ambiente, machista, mais feroz contra os índios do que John Wayne. Um bobo, disposto a derrubar a última árvore amazônica para caber mais uma vaca do agronegócio. Por anos, Bolsonaro caprichou em frases infelizes, hoje usadas para provar que é intolerante. Bem, ele enviou o filho, com o chanceler, para uma reunião com Trump. Que tinha ele a dizer ao presidente dos EUA? Ninguém investigou: admitiu-se que a viagem era um presente ao filho. Os europeus dizem que a floresta é vital para todos. E é. Por que cabe só ao Brasil o ônus econômico de preservá-la? É justo que outros países, que dela se beneficiam, ajudem a pagar a conta. Os dois que ajudavam foram atacados por Bolsonaro.
Por isso tantos gringos nos olham com má vontade.
Toda a equipe do Ministério Público Federal que trabalha na Lava Jato se afastou. Sérias divergências, não rebelião: não se fez nada fora da lei. Os lavajatistas não queriam que Raquel Dodge ficasse na Procuradoria Geral da República, mas também não gostaram de Augusto Aras, escolhido por Bolsonaro. Queriam que o escolhido estivesse na lista tríplice enviada por eles – à qual Aras não concorreu porque a lista não é prevista em lei e por achar que o MP não deve ser uma corporação fechada que indica os próprios dirigentes. O STF, comenta-se, gostou de Aras. Moro não deve ter gostado – é lavajatista. Mas nem foi consultado.
Silenciou: o superministro é mais Clark Kent do que super. Quais as consequências do desagrado dos procuradores? Talvez nenhuma: deixaram os cargos onde há poder.
Na Polícia Federal, aguarda-se a demissão, por Bolsonaro, do diretor-geral Mauricio Valeixo, da confiança de Moro. Para seu lugar, fala-se no secretário da Segurança de Brasília, Anderson Torres. E Moro? Gente que o conhece desde que era estagiário acha que vai aguentar tudo: acreditam que tem um objetivo e engolirá sapos até atingi-lo. Bolsonaro mostrou que para ele Moro já rendeu o que tinha de render. Se ficar, tem de obedecer e olhe lá.
Mas Bolsonaro faz acenos públicos de deferência a Moro e à Lava Jato. Fez mais do que pediam: em vez de vetar nove ou dez dispositivos, vetou 36. De acordo com os vetos, o juiz que mandar prender alguém em manifesta desconformidade com a lei e as provas não terá punição. Deixa de ser crime violar direitos ou prerrogativas de advogados – inviolabilidade do escritório, por exemplo. Numa busca e apreensão, pode-se apreender os computadores e será violado o sigilo de todos os clientes sem ordem da Justiça. Continua sem punição a execução de decisões judiciais “de forma ostensiva ou desproporcionada”.
Quando o juiz quiser ouvir alguém, se a Polícia o prender com escândalo, para desmoralizá-lo perante os vizinhos, não haverá o que punir. Punição para o uso irregular de algemas – vetado em súmula do STF – deixa de existir na lei. Cenas como a de Sérgio Cabral algemado por mãos e pés, pela lei que Bolsonaro sancionou deixam de ser crimes.
Só que a lei foi aprovada por ampla maioria. E há fortes possibilidades de que os vetos sejam todos rejeitados. Se Bolsonaro tivesse vetado cinco ou seis dispositivos, as chances de negociação seriam grandes. Com 36 vetos, é provável que o Congresso derrube tudo e restaure a lei como foi aprovada.
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Por Carlos Brickmann. Jornalista. Editor do site Chumbo Gordo. Texto reproduzido em diversos jornais brasileiros.
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