Durante muitos anos, a indústria de notícias concentrou suas preocupações na perda de receita ocasionada pela migração das verbas publicitárias para as redes sociais, como se essa fosse a única ameaça ao futuro do negócio.
Mas havia um outro inimigo silencioso, que foi crescendo alimentado por uma série de fatores: a fadiga de notícias.
A edição 2022 do Digital News Report do Instituto Reuters para Estudos do Jornalismo, publicada na semana passada, quantificou o tamanho do problema.
Além de constatar que a confiança nas notícias é de apenas 42% em média nos 46 países pesquisados, o trabalho mostrou que 38% das pessoas estão ativamente evitando se informar. No Brasil a taxa sobe para 54%.
O estudo é feito anualmente e por isso tem uma série histórica confiável, que aponta não apenas o retrato do momento mas também a tendência, que em pesquisa é mais importante do que uma fotografia instantânea.
O que o estudo mostra é que a tendência de se afastar do noticiário vem se acentuando. E embora a covid tenha feito muita gente acreditar mais nas notícias, a pandemia também é vista como um fator que desestimula o público a se informar, por causa da repetição.
É importante observar que a pesquisa não separa o jornalismo tradicional das informações recebidas por meio das mídias sociais. Os pesquisadores mensuram a percepção do público em relação a qualquer tipo de informação recebida em canais tradicionais ou nas redes.
E dentro das redes, elas podem vir de um blog independente dedicado a cobrir assuntos locais da comunidade ou do Facebook de uma grande emissora de TV.
Isso quer dizer que as conclusões não são relativas apenas aos grandes jornais, TVs, sites e rádios. Eles são o resultado de tudo o que o público vê como “notícia”.
E o que ele vê nem sempre agrada.
Segundo os pesquisadores, assuntos que os jornalistas consideram mais importantes, como crises políticas, conflitos internacionais, pandemias globais e catástrofes climáticas parecem ser justamente os que estão afastando as pessoas das notícias – especialmente entre os mais jovens.
Outro motivo apontado para a fadiga é a afiliação política. A Reuters cita o exemplo dos EUA, um país bem dividido entre pessoas que votam no Partido Conservador, o de Donald Trump, e no Democrata, de Joe Biden.
Segundo o estudo, aqueles que se identificam com a direita são muito mais propensos a evitar notícias porque acham que não são confiáveis ou que são tendenciosas.
Já os da esquerda são mais inclinados a se sentir sobrecarregados, relatar sentimento de impotência diante do noticiário ou achar que as notícias podem causar discórdia.
Além de afastar a audiência, a política também interfere na confiança daqueles que seguem se informando. Isso é visível em locais em que a audiência enxerga interferência de políticos, empresários ou ambos. Nesses países, a confiança é menor.
Isso acontece sobretudo na Europa Central e Oriental, onde oligarcas próximos aos partidos no poder controlam grande parte da mídia e governos regularmente cortam anúncios das publicações de que não gostam.
Apenas 7% dos gregos, 15% dos húngaros, 15% dos búlgaros e 16% dos eslovacos acreditam que a mídia de seu país é livre de influência política indevida.
No Brasil, o índice de pessoas que acham que a mídia é livre de interferência política ou econômica diminuiu em relação à última pesquisa, de 30% para 27% nos dois casos.
Essas percepções são preocupantes em uma indústria cujo modelo de negócio apoiado na propaganda é coisa do passado. As assinaturas são uma parte importante da equação do financiamento da mídia. Mas só assina quem confia e gosta da notícia que recebe.
Para essa parcela do público que desconfia abertamente ou se incomoda com o conteúdo, pagar deixa de ser a melhor opção.
Navegar em sites gratuitos, sem compromisso e sem aquele peso na consciência de pagar por algo que não está consumindo, passa a fazer mais sentido.
O risco é grande para organizações que para entregar conteúdo confiável, checado e produzido por profissionais qualificados, precisam de recursos.
Mais do que brigar com as plataformas para reaver verbas perdidas ou obrigá-las a compensar prejuízos como tem acontecido em alguns países, o jornalismo tem que resgatar confiança e ser capaz de agradar mais do que está agradando hoje em dia.
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