Entre 180 países avaliados, o Brasil ocupa a posição de número 103 no Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa 2017, apenas uma posição melhor do que no levantamento anterior, quando estava em 104º. Os dados foram divulgados na quarta-feira, 26, pela organização Repórteres sem Fronteiras (RSF), em coletiva na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no centro do Rio de Janeiro. Os dados foram divulgados, ao mesmo tempo, na França, Inglaterra e nos Estados Unidos.
De acordo com o representante da RSF no Brasil, Artur Romeu, o país está estagnado em posição classificada como “sensível” há seis anos. Esse é o terceiro indicador em lista de cinco: situação boa, relativamente boa, sensível, difícil e grave. Ele explica que o levantamento é centrado na segurança dos profissionais e que, desde 2013, vem aumentando o número de agressões a jornalistas em manifestações.
“Foram mais de 300 casos registrados entre junho de 2013 e dezembro de 2016. Na grande maioria dos casos, os jornalistas são ‘efeito colateral’ das manifestações, sendo atingidos por bombas de gás lacrimogêneo ou balas de borracha, mas não são tomados por alvos. Um caso mais difícil de investigar é quando o policial identifica o jornalista e o agride por isso”.
A organização não governamental (ONG) relata que, no atual contexto de crise e profunda polarização política, o Brasil continua enfrentando velhos problemas relacionados à liberdade de imprensa, como violência, pressões institucionais, processos abusivos, falta de transparência pública e alta concentração dos meios de comunicação.
Segundo Romeu, há preocupação crescente com os comunicadores populares nas favelas, que têm sofrido represália policial, e também com os do interior do país, que têm menos visibilidade e ficam mais vulneráveis a ameaças de pessoas insatisfeitas com as denúncias feitas. Outro problema no Brasil é o aumento de processos judiciais contra jornalistas e a quebra do sigilo da fonte.
O relatório aponta ainda a intervenção do governo na Empresa Brasil de Comunicação (EBC), com a troca do presidente e medida provisória alterando a participação social na empresa, com a dissolução do Conselho Curador. “A EBC sofreu série de ingerências do governo, tem o pressuposto de que deveria ser independente, mas não é o que a gente tem visto”, disse Romeu.
Para a direção da EBC, o Conselho Curador extrapolava suas funções invadindo a área de competência do corpo diretivo. Além disso, tinha custo elevado para a empresa, o que não condizia com a necessidade de contenção de gastos. Ainda segundo a empresa, a Lei 13.417/2017, que reestruturou a EBC, instalou no lugar do conselho um Comitê Editorial e de Programação, com número menor de integrantes e com funções mais restritas.
Segundo o diretor regional da RSF para a América Latina, Emmanuel Colombié, nos últimos cinco anos, o Brasil passou a ser o segundo país que mais mata jornalistas e comunicadores na região, depois do México. No ano passado, foram registrados três assassinatos que tiveram relação confirmada com a atuação profissional. A ONG investiga mais quatro casos.
“Não existe no Brasil mecanismos de proteção, seja no nível federal ou local, para atender os jornalistas em situação de perigo. Tem jornalistas que entram em contato conosco para dizer que estão em situação difícil. O governo não faz nada para ajudar, então continuam os assassinatos e a impunidade.”
Segundo ele, a situação geral na América Latina teve pequena melhora em 2016, mas desde 2012 se observa tendência negativa, ligada a “erosão da democracia”, a violência estrutural e problemas de impunidade e corrupção. Os países com os melhores indicadores de liberdade de imprensa na região são Costa Rica, único com situação boa, Uruguai e Chile. Os piores são Cuba, único da região com situação grave, devido ao extremo controle estatal, México e Honduras.
A representante da organização no México, Balbina Flores, diz que a situação no país é muito preocupante, com 21 assassinatos em dez anos, sendo dez apenas no ano passado. “É uma situação grave para nós, as condições do jornalismo no México. Os quatro casos mais recentes, este ano, foram situação dolorosa, porque pensávamos que isso não iria mais ocorrer em sequência. Estamos observando que a violência em diferentes estados do país. Para a RSF é um dos países mais perigosos para se exercer o jornalismo”.
Nas primeiras posições em liberdade de imprensa no mundo estão Noruega, Suécia, Finlândia, Dinamarca e Países Baixos. Em último aparecem a Coreia do Norte, Eritreia, Turcomenistão, Síria e China. Segundo a RSF, o ano de 2016 foi marcado pela “banalização dos ataques contra as mídias e o triunfo de políticos autoritários que fazem com que o mundo caia na era da pós-verdade, da propaganda política e da repressão, sobretudo nas democracias”.
O relatório aponta que “a obsessão pela vigilância e o não respeito ao sigilo das fontes contribuem para fazer com que sejam rebaixados inúmeros países antes considerados como exemplos virtuosos: os Estados Unidos (43º, -2 posições), o Reino Unido (40º, -2), o Chile (33º, -2), ou ainda a Nova Zelândia (13º, -8)”.
Como exemplos de preocupação com a liberdade de imprensa no mundo, a RSF aponta a chegada de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos e a campanha pela saída do Reino Unido da União Europeia, ambas com discursos anti-mídia, proliferação de pós-verdade e desinformação. A liberdade também diminui com a chegada de modelos políticos autoritários, como na Polônia e na Turquia.
“A Polônia de Jaroslaw Kaczynski perde sete posições no Ranking 2017. Após transformar o audiovisual público em ferramenta de propaganda política, o governo se dedicou a estrangular financeiramente vários títulos de imprensa independentes opostos às suas reformas. A Turquia do pós-golpe de Estado fracassado contra Recep Tayyip Erdogan, por sua vez, voltou-se decididamente para o lado dos regimes autoritários e se distingue agora por ser a maior prisão do mundo para os profissionais das mídias”.
No mundo 74 jornalistas ou comunicadores foram mortos no ano passado. O levantamento completo pode ser consultado no site da Repórteres sem Fronteira.
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Reportagem: Akemi Nitahara
Edição: Lílian Beraldo
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