Na última semana, reportagem de Jan Niklas para o jornal O Globo indicou as ações a serem adotadas pela Wikipédia em relação à edição de determinados verbetes — sobretudo de políticos — em meio à realização das eleições gerais de outubro. Uma das ações reveladas pela matéria é a de que quatro veículos de comunicação do país serão classificados sumariamente pela plataforma como fontes não confiáveis: Brasil 247, Diário do Centro do Mundo (DCM), Jovem Pan e Revista Oeste. Tal movimento, no entanto, gerou discussão nas redes sociais, avisos de processos e repúdio por parte de ao menos duas entidades de jornalismo.
Presidente da Associação Brasileira de Mídia Digital (ABMD), entidade criada no ano passado, Florestan Fernandes Júnior reclamou, por meio de postagem nas redes sociais, da postura adotada pela plataforma que se classifica como enciclopédia colaborativa. O jornalista registrou a sua preocupação com a decisão específica de inserir o Brasil 247, empresa da qual ele é um dos conselheiros editoriais, na lista de domínios que não poderão ser inseridos como fonte de informação.
Registro aqui minha indignação e preocupação — Florestan Fernandes Júnior, presidente da ABMD
“A campanha recente no Wikipedia para classificar vários veículos de informação como não confiáveis, incluiu o Brasil 247 nesse elenco. Registro aqui minha indignação e preocupação. O Brasil 247 é um dos mais importantes veículos de informação da imprensa independente e reúne corpo de jornalistas sérios, experimentados, comprometidos com a verdade”, afirmou o presidente da ABMD. “Mais uma das tentativas de instrumentalização da informação, que têm se sucedido nesse tempo distópico de 1pós-verdade’”, prosseguiu Florestan, conforme indicou o próprio 247.
A entidade liderada por Florestan Fernandes Júnior não foi, no entanto, a única a se manifestar contra a anunciada decisão da Wikipédia em barrar citações oriundas de Brasil 247, DCM, Revista Oeste e Jovem Pan. Em nota oficial divulgada em seu site na última sexta-feira, 25, a centenária Associação Brasileira de Imprensa (ABI) também repudiou a postura da plataforma digital e se solidarizou com os veículos de mídia. Além disso, informou que a Fórum também está na lista de blocks.
“Afinal, por que critérios o Wikipedia chegou a essa conclusão?”, questionou a entidade. “A ABI reafirma, ainda, seu compromisso com a mais ampla liberdade de informação e com a importância da diversidade de pontos de vista num regime democrático. Isso é ainda mais importante num pais como o Brasil, marcado por monopólios e oligopólios na área da comunicação. Por fim, manifestamos a expectativa de que o Wikipedia reconheça seu equívoco e volte atrás em sua decisão”, prosseguiu a ABI em texto assinado diretamente por seu presidente, Paulo Jeronimo.
Diretor de um dos alvos da Wikipédia, Kiko Nogueira, do DCM, afirmou que irá processar Rodrigo Padula, que foi apresentado na reportagem de O Globo com um dos administradores e coordenador de projetos educacionais da plataforma no Brasil. De acordo com Nogueira, Padula é “militante” do presidenciável Ciro Gomes (PDT) e “usa da plataforma para atacar veículos dos quais discorda politicamente e procurar sua extinção virtual”. O jornalista do Diário do Centro do Mundo lembrou que não foi a primeira movimentação adotada contra o veículo de comunicação.
Há um grupo de ciristas infiltrado na enciclopédia virtual que funciona como pistoleiros de aluguel — Kiko Nogueira, diretor do DCM
“Em janeiro, Padula chegou a propor a eliminação do verbete do DCM, classificando o site como ‘blog sem credibilidade e notoriedade’. Foi voto vencido e o verbete segue de pé”, mencionou Nogueira, que resgatou postagens em que Rodrigo Padula tece elogios a Ciro Gomes e, por outro lado, critica adversários do ex-governador do Ceará. “Há um grupo de ciristas infiltrado na enciclopédia virtual que funciona como pistoleiros de aluguel. Fica a questão se são pagos e como é que a reportagem do Globo entrevistou justamente essa ‘turma boa’, pontuou o diretor do DCM, que ainda enfatizou: “não irão nos calar”.
Ao que tudo indica, Padula não será processado apenas pelo diretor do Diário do Centro do Mundo. Diretamente em seu domínio, o Brasil 247 também informou que irá acionar o poder Judiciário contra o administrador da Wikipédia. Fundador e diretor-geral do site, Leonardo Attuch publicou um “fio” no Twitter abordando o caso. Entre outros pontos, argumentou que a plataforma “pode estar sendo instrumentalizada para atacar veículos de comunicação independentes antes das eleições”.
As decisões da plataforma não podem ser politicamente orientadas — Leonardo Attuch, fundador do Brasil 247
Assim como Kiko Nogueira, Attuch chamou a atenção para a militância política de Rodrigo Padula. Para ele, o homem que foi entrevistado pelo jornal O Globo como um dos responsáveis pela administração da versão brasileira da Wikipédia apresenta, nas redes sociais, “intensa atividade política, em favor de uma candidatura presidencial, a de Ciro Gomes”. O jornalista ainda atentou-se ao fato de que, ao menos em teoria, tal postura iria contra os princípios propagados pela própria rede de enciclopédia colaborativa.
Em seu perfil no Twitter, Rodrigo Padula se apresenta como “wikipedista”. Na rede social, além dos posts divulgados por Kiko Nogueira e Leonardo Attuch, ele tem histórico de se manifestar politicamente. No último fim de semana, por exemplo, fez questão de compartilhar imagem em que se identifica como alguém que não votará nem em Lula e nem em Bolsonaro. Por outro lado, publicações em tom elogioso a Ciro Gomes são frequentes. Colega de Ciro no PDT e pré-candidato ao governo fluminense, Rodrigo Neves é classificado por Padula como “o melhor nome para o Rio de Janeiro”.
Ameaçado de processo, Rodrigo Padula tem promovido — praticamente sozinho — campanha de difamação contra o Brasil 247 na rede mundial de microblogs. No decorrer dos últimos dias, o “wikipedista” protagonizou dezenas de postagens com a hashtag #Brasil247Mente. Entre os poucos perfis que, aparentemente, aderiram ao movimento estão “Jogo Político com o Ciro” e “Tiago com Ciro”.
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