Antes da falarmos sobre a cobertura do dia 28 de abril, marcado por greve e manifestações em inúmeras cidades no Brasil, é importante atentar para a cobertura prévia ao dia de paralisação. Segundo reportagem do Portal Comunique-se, o Jornal Nacional, telejornal de maior audiência no país, ignorou completamente a greve geral em sua edição de 27 de abril. Nem mesmo sob o ângulo dos incômodos que provavelmente seriam gerados pela greve (dificuldades de deslocamento pelas cidades, por exemplo, já que trabalhadores do transporte público confirmaram adesão ao movimento) o assunto foi mencionado. O silêncio prévio a respeito da paralisação pairou sobre outros veículos de comunicação, mas, segundo tweet postado pelo jornalista da TV Globo, Flávio Fachel, notícia “é o que acontece” – o que justificaria, então, que não houvesse menção à greve antes de ela ocorrer. Essa postura de boa parte da grande mídia é bastante curiosa, sobretudo quando comparada à atenção que os principais veículos de comunicação do país ofereciam aos atos favoráveis ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Dias (e até semanas) antes de acontecerem, os atos eram noticiados, inclusive no próprio Jornal Nacional – quase como um convite para as “pessoas de bem” aderirem aos eventos festivos e familiares.
Por falar nos brasileiros “de bem”, a cobertura do movimento grevista, quando finalmente aconteceu, foi marcada pelo enquadramento negativo – também em contraposição aos atos pró-impeachment. Vândalos e baderneiros que ousaram atrapalhar o dia de trabalho das pessoas ao invés de deixarem a manifestação para o feriado que se aproximava: esta foi a descrição comum a várias reportagens, mesmo que apenas implicitamente. Basta observar as fotos das primeiras páginas dos jornais de maior circulação no país, conforme se apurou em outra reportagem do Portal Comunique-se, para perceber o viés negativo dado às reportagens. Salvo exceções que apenas confirmam a regra, como o mineiro Estado de Minas e o gaúcho Zero Hora, os veículos impressos se limitaram aos inconvenientes de uma greve marcada para um dia útil, sem se preocuparem com a busca pela compreensão das razões para tal ato e as motivações dos participantes e dos que não aderiram à paralisação. Parecia implícita a ideia de que o modelo correto para manifestações é o que foi adotado nos protestos pelo impeachment – aos domingos, sem atrapalhar o trânsito e com a simpática proteção da polícia. Nada de confronto, apenas uma mostra da cordialidade do brasileiro. Portanto, durante e após a greve geral de 28 de abril, o problema deixou de ser falta de espaço e passou a ser a parcialidade na maioria das reportagens – o que, naturalmente, empobrece a cobertura.
Estive na manifestação em Belo Horizonte para conversar com alguns participantes, assim como faço desde 2015 para alimentar meu canal Politube, no YouTube, e não encontrei colegas jornalistas no meio dos manifestantes. O que notei foi, de modo geral, a falta de coberturas que buscassem entender o que pensam e quais são os medos, anseios e reivindicações de alguns dos participantes do movimento (porque, afinal, não se trata de um grupo homogêneo de pessoas). Não estou dizendo que os impactos negativos da greve devessem ser ignorados pela mídia – até porque greve que não gera incômodos não cumpre seu propósito de demonstrar a importância daqueles trabalhadores cujos serviços param de funcionar temporariamente – mas que o foco não deveria recair apenas sobre estes efeitos. Além disso, a preocupação apenas com o número de manifestantes serve para que, exatamente? Numa sexta-feira chuvosa em alguns pontos do país e com paralisação no transporte público, é um equívoco dar a entender que a rua esteve ocupada apenas por uns poucos baderneiros e que isso demonstra o fracasso do movimento.
A responsabilidade social dos veículos de comunicação vai muito além de apresentar uma cobertura propositadamente superficial e enviesada. Bom seria se pudéssemos acreditar que os erros de agora servirão de aprendizado para a cobertura dos próximos movimentos grevistas – que certamente vão acontecer, diante das medidas adotadas pelo Executivo e Legislativo brasileiros.
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Por Nayla Lopes.
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