Relação de salário adicional com acúmulo de função dentro do jornalismo é tema do artigo do jornalista e advogado Kiyomori Mori
Todo jornalista conhece redações nas quais, com frequência, o editor escreve reportagens, a repórter faz revisão ortográfica e o revisor acaba verificando, também, a edição online do veículo de mídia.
Essas situações, em que o jornalista realiza mais funções do que foi inicialmente contratado, são chamadas de acúmulo de função – e podem resultar no pagamento de adicional de até 40% sobre o salário.
Para verificar a incidência do adicional, primeiro é preciso saber se o acúmulo ocorre de forma rotineira. Ou seja, não é porque o editor escreveu uma reportagem sobre o lugar que visitou nas férias do verão passado que passaria a deter o direito ao adicional todos os meses em seu contracheque. Também não vale para o repórter que revê eventualmente o texto do colega na hora do fechamento cobrar esse valor. É preciso que o acúmulo de funções seja frequente.
O segundo passo é verificar se o acúmulo de funções resulta no enriquecimento indevido da empresa. Em geral, isso pode se constatar após algum passaralho, em que jornalistas “sobreviventes” passam a acumular a função dos demitidos. No caso, é comum ocorrer o chamado “acúmulo horizontal”, ou seja, o jornalista acumular funções de outros jornalistas de seu mesmo nível hierárquico, dentro da mesma função.
Por exemplo: um “repórter de economia” que cobre o setor de indústrias e que passa a desempenhar a função de “repórter de finanças”, em razão de corte da vaga do colega. Ou, ainda, o editor de cotidiano que começa a editar conjuntamente os especiais de fins de semana.
Nessa situação, a empresa passa a se locupletar (ou seja, enriquecer) indevidamente do trabalhador, pois deixa de pagar salário de dois jornalistas para remunerar apenas um (a maior parte das vezes até mesmo sem horas-extras), e continua tendo o mesmo jornal para vender, mas com custo reduzido. Daí porque a Justiça determinar o pagamento do adicional, como forma de equilibrar a situação contratual que foi alterada em prejuízo do jornalista, sem nenhuma contrapartida da empresa.
Essa regra também vale ao contrário: se a empresa não se enriquece com sacrifício demasiado do jornalista, ele também não terá direito ao adicional. Assim, o editor de uma revista bimestral, de poucas páginas, que escreva reportagens, pode não ter direito ao adicional. Tudo vai depender de cada situação e do caso concreto.
Na cidade de São Paulo, a Convenção Coletiva do Sindicato dos Jornalistas já prevê o adicional de 40% sobre o salário, pelo período que durar o acúmulo de função. Mas, em alguns outros estados, as convenções coletivas não trazem esse direito – muitas vezes sequer existe convenção coletiva.
Nesse tipo de situação, mesmo assim, é possível obter o adicional na Justiça pela aplicação da legislação de radialista (lei 6.615/78), que já trata do adicional na sua própria regulamentação da profissão.
A ministra Rosa Weber (essa mesma que participa do julgamento do mensalão), quando integrava a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) concedeu o direito do adicional de 40% para uma editora de Santa Catarina, que acumulava a função de pauteira (RR-3542-2004-034-12-00.8), ainda que não previsto em Convenção Coletiva. Nesse caso, a jornalista em razão da sobrecarga de trabalho voltou a sentir sintomas de fibromialgia, doença que estava controlada até o início do acúmulo de funções. O caso é considerado até hoje um importante paradigma para inspirar decisões de juízes de todo país.
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Kiyomori Mori. Advogado e jornalista (MTB/SP 37019). Sócio do escritório Mori e Costa Teixeira Sociedade de Advogados, atuante no Estado de São Paulo, na defesa dos direitos trabalhistas, autorais e de responsabilidade civil de jornalistas. Editor do blog Direitos dos Jornalistas. Foi um dos colaboradores do projeto educacional Para Entender Direito, em parceria com a Folha de S. Paulo. Membro do Conselho de Mantenedores da Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo.
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