Atos hostis foram registrados em meio à cobertura do caso que terminou com a prisão do ex-presidente Lula. Em pleno Dia do Jornalista, pelo menos 11 comunicadores foram alvo da ira de manifestantes contra a imprensa
Parte dos repórteres, cinegrafistas, assistentes e fotógrafos envolvidos na cobertura dos últimos acontecimentos relacionados a Lula não teve o que comemorar no Dia do Jornalista em 2018. Ao decorrer do sábado, 7 de abril, ao menos 11 profissionais da imprensa tiveram seus trabalhos prejudicados. Eles foram alvos da ira de manifestantes contrários à prisão do ex-presidente da República. Agressões físicas e xingamentos aconteceram.
Rede TV
Dedicada a informar os últimos detalhes ocorridos em torno da sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, onde o líder petista estava desde a divulgação do mandado de prisão, a equipe da Rede TV, assim como integrantes de dezenas de outros veículos de comunicação, se dirigiu à cidade de São Bernardo do Campo (SP). A intenção de fazer jornalismo foi comprometida. O carro da reportagem foi danificado e os funcionários da emissora foram obrigados a deixar o local.
Imagens aéreas registraram o momento em que o repórter Igor Duarte, o cinegrafista Ricardo Luiz e o assistente Everaldo Guimarães foram cercados por militantes. É possível ver que uma mulher tenta acertar os jornalistas com um tipo de cabo. Informações divulgadas pelo Estadão dão conta que, além da agressão física que contou com arremesso de latas de cerveja, o trio da Rede TV foi ofendido. “Golpistas” foi o termo ecoado pelos agressores.
O caso provocou a indignação por parte do superintendente de jornalismo e esportes da Rede TV, Franz Vacek. O executivo repudiou o ato, mas fez questão de avisar que os jornalistas escalados para a cobertura estavam bem. “Lamentável”, escreveu em sua página no Facebook. “Sem liberdade de imprensa não há democracia”, prosseguiu. “Absurdo que jornalistas não possam trabalhar”, reclamou, em outra postagem, o gestor do canal de televisão.
Grupo Bandeirantes
Não foi só a Rede TV que teve funcionários vítimas da agressividade de militantes presentes no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Três repórteres de veículos do Grupo Bandeirantes de Comunicação foram agredidas. Em pleno link para o BandNews TV, a jornalista Joana Treptow levou tapa na mão, fazendo com que o microfone caísse no chão. “Um idiota”, definiu o âncora do canal. Minutos depois da agressão, ela e a equipe da emissora deixaram o local por questões de segurança.
Saí do sindicato. Fui obrigada a tal. Tentamos e conseguimos trabalhamos apesar dos pesares. Ficaríamos mais se não estivéssemos expostos e em perigo. Grupos de baderneiros. Grupos isolados, digo de novo. Perigosos, também. Vergonhoso.
— Joana Treptow (@joanatreptow) 7 de abril de 2018
Repórter da BandNews FM, Gabriela Mayer levou um tapa na barriga. De acordo com informações divulgadas pela própria emissora, a mulher que agrediu a jornalista também tentou roubar o seu telefone celular. Repórter da Rádio Bandeirantes, Bruna Barboza usou o Twitter para relatar que foi cercada por militantes. Além da intimidação, a comunicadora destacou que foi chamada de “fascista” e integrante da “elite branca” e “mídia golpista”.
Acabo de sofrer uma agressão na frente do Sindicato dos Metalúrgicos. Estava ao vivo e fui cercada por militantes ao som de “fascista”, “elite branca” e “mídia golpista”. Procurei arrego num estacionamento daqui de frente. Difícil trabalhar com medo
— Bruna Barboza (@eubrunabarboza) 7 de abril de 2018
Jovem Pan
“Estou trabalhando”. Dessa forma, Caio Rocha, repórter da Jovem Pan, se dirigiu a manifestantes que o cercaram durante transmissão ao vivo – registrada em vídeo – para a emissora radiofônica. Antes de ter o seu trabalho interrompido, ele avisou que os ânimos estavam exaltados e que chegaram a perguntar se ele estava a serviço da TV Globo. Do estúdio, o comentarista Marco Antonio Villa criticou a omissão das autoridades responsáveis pela segurança pública no estado de São Paulo.
Grupo Globo
Jornalistas de veículos do Grupo Globo também foram vítimas da agressividades de militantes favoráveis a Lula. Pela manhã, Pedro Durán, da CBN, foi informado por um homem que não era “bem-vindo” no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. De acordo com a Agência Brasil, ele teve de deixar o local após ser empurrado pelo agressor, que tentou o acertar com objetos. A própria emissora divulgou vídeo mostrando o comunicador sendo cercado..
À noite, Roberto Kovalick estava no comando da equipe de reportagem escalada para a TV Globo para acompanhar a chegada do ex-presidente ao aeroporto de Congonhas, na capital paulista. Defensores do político, porém, hostilizaram os profissionais, que se viram obrigados a deixar o ambiente. De Congonhas, o ex-presidente, já sob cuidados de agentes da Polícia Federal, embarcou para Curitiba, onde cumprirá a pena imposta pela Justiça.
Agressões em Curitiba
Com a chegada de Lula à superintendência da Polícia Federal na capital paranaense, a onda de agressões a profissionais da imprensa prosseguiu. De acordo com O Globo, os jornalistas Douglas Santuci, da TV Bandeirantes, e Ana Zimmerman, da RPC (afiliada da TV Globo), foram chamados de “golpistas”. “Vestindo camisas da CUT e usando bonés do MST, os militantes também se insurgiram contra jornalistas que se protegiam do sol forte debaixo de uma tenda da RPC”, destaca a matéria.
Agressões anteriores
Fora os casos envolvendo pelo menos 11 profissionais em pleno Dia do Jornalista, outros comunicadores foram agredidos e hostilizados desde que o juiz Sergio Moro expediu o mando de prisão do ex-presidente Lula. Na quinta-feira, 5, além dos episódios registrados pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e reproduzidos pelo Portal Comunique-se, a repórter Sonia Blota, da Band, levou uma ovada de militantes do Partido dos Trabalhadores. Ela ainda foi obrigada a ouvir que pertencia à “mídia golpista”.
Tenho orgulho da minha militância política na época da faculdade e, já na profissão, sempre zelei pela informação sem tendências. Infelizmente tomei uma ovada de militantes do PT que gritavam “mídia golpista”.Que pena! Logo com uma profissional que sempre lutou contra a censura.
— Sonia Blota (@soniablota) 6 de abril de 2018
Entidades se posicionam
Sobre os atos hostis promovidos por militantes pró-Lula, entidades ligadas aos profissionais da mídia divulgaram notas. Em conjunto, a Associação Nacional de Jornais (ANJ), a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e a Associação Nacional de Jornais (ANJ) classificaram que a liberdade de imprensa e o direito à informação foram desrespeitados. Para a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), as agressões abalam a democracia brasileira.