Ferramentas. Treinamento. E tempo. Segundo Samaruddin Stewart, especialista em tecnologia de mídia da Califórnia, é disso que os jornalistas precisam para combater a desinformação de maneira mais efetiva. Stewart veio ao Brasil em agosto para participar do Congresso da Jeduca e de um evento na Faculdade Cásper Líbero em parceria com a Embaixada e os Consulados dos Estados Unidos no Brasil, no qual ele falou sobre as habilidades necessárias para o exercício do jornalismo.
“Quem de vocês já viu uma imagem ou vídeo falso na internet?”, perguntou Stewart, que viu as mãos dos jornalistas na plateia se levantarem em uma resposta unânime. As imagens manipuladas e, mais recentemente, os áudios e vídeos — apelidados de deep fake — criaram um sentimento de incerteza em consumidores de notícias, que precisam duvidar até daquilo que estão vendo. Mas o especialista não veio ao Brasil como mensageiro do fim dos tempos. Pelo contrário, ele acredita que os jornalistas podem ajudar a consertar esse “ecossistema de desinformação” com as ferramentas certas e com a ajuda da educação midiática.
Para ilustrar como as redações estão usando a tecnologia para descobrir a verdade, Stewart citou a experiência da BBC de Londres narrada no vídeo “A anatomia de uma execução brutal” (contém imagens fortes). A emissora inglesa conseguiu identificar o local da gravação e os responsáveis pelo assassinato de duas mulheres por meio de “imagens de satélite, perfis no Facebook, análise de sombras projetadas no chão, armas e uniformes que aparecem no vídeo, além de informações de fontes”, como descreve a reportagem sobre o caso. As imagens de satélite são do software Google Earth Pro, disponível para download gratuitamente.
Há caminhos mais simples que podem ser usados para checagem de imagens. Stewart indicou as ferramentas TinEye, Yandex e o Google como possíveis caminhos para fazer uma busca reversa por imagem, mas alertou que não basta verificar a autenticidade. “Não é preto no branco. Se uma imagem for verdadeira, não significa que o contexto no qual ela foi usada é o correto.” Como exemplo, ele citou a checagem e contextualização feita pela Agência Aos Fatos após o presidente Jair Bolsonaro publicar imagens de um evento de caças de baleias na Dinamarca como se fossem da Noruega.
O grande desafio, segundo Stewart, é o tempo que a contextualização leva para ser feita. O trabalho de checagem é reativo e, frequentemente, as informações falsas ganham muito mais atenção do que as verdadeiras. “É importante que exista um balanço entre o trabalho reativo e pró-ativo do jornalismo”, defende. “Eu acho que uma saída é combinar o uso da tecnologia e a intervenção humana”.
O especialista acredita que com o avanço do aprendizado sobre as redes de desinformação e da tecnologia, os seres humanos poderão intervir nos casos em que impacto da informação falsa for maior. “Alguém terá que definir qual é a prioridade. Então se algo é muito importante, humanos devem fazer; se for menos importante, os robôs podem cuidar disso”.
Stewart elogiou o trabalho do Projeto Comprova durante a entrevista. A coalizão de mídia coordenada pela Abraji reúne 24 veículos para analisar e combater a disseminação de rumores. Em 2018, o foco foram informações sobre a eleição. Em julho, a segunda edição do projeto retomou atividades com foco no combate à desinformação sobre políticas públicas relacionadas ao governo federal. O especialista acredita que o banco de dados coletados durante as eleições de 2018 pode ser extremamente valioso no próximo ano, quando acontecem as eleições municipais. Algumas das notícias falsas podem se repetir, o que facilita o trabalho de checagem.
Por fim, Stewart disse que se fosse escolher um foco para o combate à desinformação seria a educação midiática para crianças e jovens. “Eu conheço pessoas mais velhas que compartilham informações sem sentido e eu não sei se elas vão parar de fazer isso”, comenta. “Talvez não seja o melhor investimento de tempo focar nessas pessoas, mas sim nos jovens, que tem uma vida inteira pela frente para consertar esse ecossistema”.
Para verificar a autenticidade de uma imagem, use ferramentas de busca reversa: Google Imagens, TinEye, Yandex. Para descobrir os metadados de uma foto e obter informações sobre onde, com que dispositivo e quando ela foi tirada, acesse o site Jeffrey Exif. Para baixar o usado pela BBC na investigação sobre os assassinatos, acesse o site. Se quiser ler trabalhos acadêmicos sobre manipulação de imagens, acesse: tinyurl.com/deepfakebr.
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Por Natália Silva.
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