As notícias falsas ou fake news foram apontadas pelo ministro Tarcísio Vieira, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), como um dos desafios das eleições de 2018, ao lado do financiamento de campanha e do voto impresso. Ele foi um dos convidados da sessão temática que debateu no Plenário do Senado, nesta quarta-feira (21), o impacto desse fenômeno no cenário político brasileiro.
Representantes da mídia tradicional e especialistas em informática também debateram os custos sociais e culturais da desinformação.
O TSE tem um conselho consultivo de combate às fake news nas eleições, explicou Vieira. Para ele, apesar da dificuldade do Judiciário em lidar com o tema, a legislação brasileira avançou bastante com o Marco Civil da Internet, que prevê punição para a divulgação de notícias falsas e a reforma política aprovada em 2017, que também trata da questão.
Mesmo com a possibilidade de impulsionar conteúdos na internet na próxima campanha política — ou seja, fazer divulgação nas redes sociais, em aplicativos de mensagens e em e-mails — ainda segue proibida a propaganda eleitoral paga, a menos que o material já venha classificado como propaganda e não induza o eleitor ao erro, permitindo que ele mesmo faça seu juízo de valor, alertou o ministro.
Para o secretário-geral da presidência do TSE, Carlos Eduardo do Amaral, as fake news há várias formas de manipulação na internet, como a alteração na ordem de busca em uma plataforma de pesquisa. Notícias enganosas também podem ser usadas para desviar a atenção da mídia, desacreditar opositores e criar desinformação.
— Você prejudica a qualidade do voto do cidadão. Esse ambiente de divulgação de notícias que, supostamente, tendam a não refletir, consciente ou inconscientemente, o que efetivamente acontece, prejudica a formação de um voto consciente por parte do eleitorado — avaliou.
Com a experiência de um ex-hacker da internet, o consultor de segurança digital Daniel Nascimento vê na tecnologia a principal saída para o problema. Ele defendeu a adoção de uma plataforma colaborativa, com o uso da inteligência artificial e da análise de dados, para detectar as notícias falsas e agir instantaneamente.
— E se houvesse um sistema que entregasse na mão do cidadão a checagem dos fatos com apenas um click e de uma forma intuitiva? A eleição do próximo semestre vai ser um campo minado na internet. Já existem pessoas vendendo programas capazes de espalhar fake news e controlar parte da opinião pública tendo candidatos como alvos. É só pagar uma assinatura para esses criminosos e esperar o estrago ser feito — disse.
As plataformas de tecnologias vivem da atenção e do vício dos usuários, disse o presidente do Instituto Brasileiro de Direito Digital e procurador do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), Frederico Ceroy. Para ele, o combate às fake news passa pela checagem da notícia para derrubada do conteúdo por meio dos termos de uso e política de privacidade.
– Fake news não é simplesmente aquilo que aparece no feed de notícias nosso. Fake news, que abala a eleição e abala a democracia, é um movimento coordenado que, muitas vezes, está por debaixo dos panos, e nós não estamos vendo.
Ceroy também apoia a ação conjunta das autoridades com as plataformas e sugere o exemplo da legislação alemã como modelo, em vez das leis eleitorais ou criminais com menos punição para o usuário e mais responsabilização das empresas.
Em defesa do trabalho de apuração do jornalista, profissional que “tem cara, endereço, e-mail publicado e pode ser responsabilizado se errar”, o presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Paulo Tonet Camargo, destacou as diferenças da atividade da imprensa tradicional em contraposição às plataformas de tecnologia, que não são veículos de comunicação.
— Acho que nunca o jornalismo profissional foi tão necessário como hoje em dia, em tempos de fake news, disse o diretor da sucursal da Folha de S.Paulo em Brasília, Leandro Colon.
A Folha anunciou que deixaria de publicar seu conteúdo no Facebook. Na opinião do jornal, [a nova política da rede social] reforça a tendência de o usuário consumir cada vez mais conteúdo com o qual tenha afinidade em detrimento do conteúdo distribuído pelas empresas.
A presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor), Angela Pimenta, trata as fake newscomo poluição informativa no espaço digital. Para enfrentar o problema, ela recomenda checagem e verificação, valorização da informação de qualidade e educação midiática.
— Acreditamos que o jornalismo brasileiro tem capacidade e disposição para uma iniciativa nesses moldes. Em termos de curto prazo, essa é a melhor abordagem contra a desinformação. O nosso trabalho jornalístico poderia ajudar a polícia e o TSE a responsabilizar criminalmente agentes da desinformação — avaliou.
O presidente do Conselho de Comunicação Social do Senado, Murilo Aragão, disse que a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos ampliou o fenômeno e gerou uma guerra midiática para a qual o país não estava preparado. Ele defendeu a liberdade de expressão e a necessidade de mudar a legislação, mas sem nenhum tipo de censura.
Sugestão do senador Telmário Mota (PTB-RR), que requereu a sessão temática, abre espaço para a criação de delegacias especializadas para dar celeridade na investigação das notícias falsas propagadas na internet, tanto sobre o autor como sobre quem reproduz o conteúdo.
— Nesse processo político em que a gente se encontra, talvez não tenhamos mecanismos tão rápidos e fortes, dentro da legalidade, que possam dar uma resposta para a sociedade sobre o que realmente a gente precisa. Se criássemos esses juízos especiais para isso, com delegacias especiais, em 72 horas, nós teríamos já a punição ou a localização do responsável — observou.
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