Tidos como piadas ou recriminados pelos defensores do politicamente correto, os mitos de gênero se confirmam na maioria das vezes: homens sabem ler mapas, mulheres encontram objetos em gavetas mais facilmente. Homens privilegiam o monólogo e falam menos, mulheres gostam de diálogo e falam mais. Homens empreendem, mulheres gerenciam. Homens têm foco, mulheres são multitarefas
Tudo isso requer, no entanto, uma análise biocomportamental. No período em que o cérebro teve sua maior evolução —hoje ele continua muito similar, cabia aos homens caçar e pescar e às mulheres cuidar da moradia e dos filhos. Eles precisavam ter uma noção de espaço aguçada, visão focada na distância, ser silenciosos para não espantar as presas, buscar algo que não possuíam e concentrar-se naquela única missão. Elas, por sua vez, tinham de viver em espaços reclusos e restritos, com visão próxima e na penumbra, fazer barulho para manter a moradia a salvo dos predadores, cuidar do que possuíam e lidar com várias atividades ao mesmo tempo, até pela quantidade de filhos.
Outro aspecto interessante, de acordo com estudos biocomportamentais recentes, é que a reação ao perigo era radicalmente distinta em homens e mulheres. Se eles respondiam a uma ameaça com o típico “fight or flight” (lutar ou fugir), elas apelavam para o “tend and befriend” (cuidar e fazer amizade), porque seu objetivo era preservar o máximo de sua cria.
Essa propensão a compor com os outros é atribuída, em inúmeras pesquisas, ao fato de o hormônio feminino estrogênio alavancar os efeitos da oxitocina, que estimula o amor e o “instinto maternal”.
A economia industrial, onde havia escassez, sempre foi baseada na dominação e no controle, não na colaboração e no senso de comunidade. Assim, sempre foi claramente masculina. Afinal, lutar ou fugir e a hostilidade XY são o que viabiliza tanto a dominação como o controle.
A economia pós-industrial, caracterizada pela abundância resultante da globalização e das tecnologias em rede, pede, ao contrário, colaboração e senso de comunidade. É uma mudança de paradigma gigantesca e, embora já muito alardeada, ainda se mostra pouquíssimo compreendida.
A única coisa que falta para a necessária revolução é justamente entender e aceitar o papel dominante das mulheres na economia pós-industrial, pois, para elas, a colaboração e o senso de comunidade são o padrão. (Trata-se do papel do arquétipo feminino, uma vez que este pode ser incorporado por homens também, assim como tantas mulheres incorporaram o arquétipo masculino na economia industrial.)
Em um ambiente de escassez, homens se dão melhor porque há uma disputa contínua pelo poder, que requer luta ou fuga. Num ambiente de abundância, onde qualquer estrutura é mais participativa e descentralizada, é a mulher que se sai melhor, cuidando dos outros e fazendo amizades. Se os homens insistirem em continuar à frente nesta era de abundância, tenderão a forjar a escassez para manter o poder. E os resultados tendem a ser desastrosos para todos.
Só elas podem levar esta nova economia em rede a um estado de graça, enquanto nós talvez a conduzamos a um cataclismo. Nós, homens, somos analógicos e as mulheres é que são digitais. É a elas, e ao arquétipo feminino, que este mundo pertence. Os líderes da maioria das empresas ainda não perceberam isso. E você?
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Walter Longo. Publicitário e administrador de empresas com MBA na Universidade da California (Estados Unidos). Atualmente, é presidente executivo do Grupo Abril. Texto publicado originalmente no LinkedIn, rede social em que o autor é um “influencer”.
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