Joesley Batista deu pistas do que iria fazer: por exemplo, batizou seu iate (modelo Leonardo, cem pés, ou 30 metros, de comprimento, três andares, o mais caro do estaleiro italiano Azimut) com nome em inglês, Why Not?, e mandou transportá-lo para Miami. O iate vale uns nove, dez milhões de dólares, mas os organismos oficiais que cuidam de exportações não o perceberam, ou não acharam necessário relatar nada, ou a relataram e, como no Governo ninguém conhece Joesley, tudo passou despercebido.
Joesley teve sorte de ser pouco conhecido. Isso lhe permitiu, embora com ordem do presidente Temer, algo difícil: atravessar numa boa as cercas eletrônicas do Palácio do Jaburu, livre de câmeras indiscretas, sem sequer um guarda para pedir-lhe que deixasse na portaria objetos que não deveria levar para uma conversa com o presidente, como celular ou um gravador (que usou para gravar e delatar o amigo). Dá para controlá-los de longe, Joesley sabe. Já comprou em Nova York um vibrador com wi-fi. Ou poderia ter uma arma. Amigo? Tiro de amigo é igual a tiro de inimigo. Uma pistola moderna é leve, silenciosa e faz um tremendo estrago.
Joesley é corajoso: encontrou-se com Temer altas horas da noite, nos porões do palácio. Este colunista só iria a uma reunião assim com alho no bolso. Pense em encontrar Temer no porão, à noite, de terno escuro.
Achou graça nesses absurdos? Não deveria: eles acabam de acontecer.
Verdade é…
Sindicalistas vociferantes, e seus amigos desordeiros mascarados, atacam ministérios, depredam o que podem, incendeiam um deles, fazem o que querem com equipamentos eletrônicos que armazenam a rotina de todo o país. Talvez haja algum serviço interno de combate a incêndios, mas na TV não apareceu. Seguranças? Procure nos orçamentos ministeriais, está lá: empresas terceirizadas de prestação de serviços de segurança (e portaria, e limpeza, etc.). Procure na porta, nos filmes dos tumultos em Brasília, e não encontrará ninguém.
O jornalista Luis Mir, em seu livro Guerra Civil – Estado e Trauma, mostra os dados oficiais: proporcionalmente ao número de habitantes, Brasília tem o triplo dos policiais de Berlim. Mas, diante dos vândalos comandados por pelegos, é preciso chamar o Exército.
…a mentira…
A Polícia Militar não sabia de nada. Deveria saber: a data estava marcada. Na véspera das manifestações, a PM interceptou vários ônibus fretados, revistou-os e encontrou armas brancas, porretes, socos ingleses. Parlamentares do PT pediram ao governador de Brasília que as revistas fossem suspensas. O pedido foi negado. Mesmo assim, surgiram na manifestação bombas caseiras, escudos, muito material de ataque.
Como o PT e as centrais sindicais garantiram, depois do tumulto e dos prejuízos, que nada tinham a ver com os vândalos, por que os parlamentares pediram que os ônibus – eram 900, que levaram de 35 a 40 mil pessoas à manifestação – não fossem revistados, isso num momento em que já se sabia que transportavam material para o quebra-quebra?
…que aconteceu
Para o leitor que não está entendendo nada do que acontece (o que é muito justo, já que é complicado mesmo), aqui vai um pequeno resumo:
O Brasil estava indo muito bem, com crescimento sustentável, terra para quem quisesse plantar, terrenos à vontade, bem situados, para construir moradias; agricultura forte, preservação ambiental, qualidade de vida, habitantes orgulhosos do povo e do país.
Então, uma caravela atracou em Porto Seguro e tudo desandou.
Culpa…
A Associação Brasileira de Imprensa acusou a Procuradoria Geral da República por violação do segredo da fonte. Pelo artigo 5º da Constituição, a fonte do jornalista é sigilosa. Se houver processo, ele é que responde. Pois o ministro Edson Facchin liberou o sigilo da delação premiada que atingiu Andréa, irmã do senador Aécio Neves, PSDB. Legalmente, o material que não se referisse ao caso teria de ser destruído.
Mas não foi: alguém separou das horas de grampo do telefone de Andréa o trecho em que conversava com o jornalista Reinaldo Azevedo, de Veja e da Rádio Jovem Pan. Justo ele, que vinha criticando a forma das investigações!
…sem culpados
Tanto a PGR quanto a PF concordam: houve quebra do sigilo. Ambas negam ser culpadas. Mas bem que poderiam contar a verdade, mesmo que seja difícil de acreditar. As gravações referentes a Reinaldo Azevedo são espertíssimas e saíram sozinhas do material a ser destruído. Enviaram-se a jornalistas, fingindo que a remessa era de alguma autoridade.
Foi assim que tudo aconteceu: ninguém é culpado pela ilegalidade, nem mesmo as gravações desobedientes – pois quem vai julgar a culpa de uma gravação?
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Carlos Brickmann. Jornalista. Editor do site Chumbo Gordo. Texto reproduzido em diversos jornais brasileiros.