Advogado e jornalista, Kiyomori Mori analisa quando o profissional da imprensa deve receber adicional por acumular várias funções dentro de uma redação
Com as redações cada vez mais enxutas, aliada ao desenvolvimento da tecnologia, é bastante frequente o jornalista desempenhar várias funções para um mesmo veículo. Há desde o repórter de jornal impresso em que a própria redação já fornece câmera fotográfica no primeiro dia de trabalho, como também a figura do “redapórter” (nomenclatura derivada das funções de “redator” e “repórter”, que uma amiga me disse que existe na Folha).
Se o jornalista tiver curso superior em Letras é bem possível que ele também desempenhe o papel de revisor do periódico no dia do fechamento. E por aí vai: a criatividade para economizar dinheiro da redação é quase infinita – sempre à custa de jornalistas estressados, pescoções sem fim, perda do convívio familiar e vida social restrita a amigos da redação.
Por isso, é bastante frequente ouvir comentários – muitas vezes em tom de brincadeira – de que “vou pedir adicional de acúmulo de função!”. Pois bem.
O adicional de acúmulo de função existe, sim, e ele serve para dar um equilíbrio ao contrato de trabalho. É como o adicional de periculosidade (para trabalhadores que desempenham suas funções em lugares arriscados, como em abastecimento de avião, no percentual de 30%) ou o adicional noturno (para quem trabalha após as 22h, no percentual mínimo de 20%).
A diferença é que os adicionais “famosos” (noturno, periculosidade, insalubridade etc) estão previsto na lei para qualquer trabalhador que desempenhe funções nessas condições. Ou seja, se o jornalista trabalhar em área de risco (subir morro diariamente para fazer reportagem) e depois esticar a jornada no pescoção fará jus a esses dois adicionais na conta final do holerite.
Já o adicional de acúmulo de função está previsto em lei somente para poucas profissões, como os radialistas (locutores, operadores de VT etc). No caso, a lei 6.615/78 prevê a esses profissionais o pagamento do adicional de acúmulo de funções de 10 a 40%, dependendo da função acumulada.
Para os jornalistas, a situação é um pouco mais complicada (e injusta). Isso porque se ele trabalhar em São Paulo (cidade) já há previsão na Convenção Coletiva do pagamento do adicional de 40% sobre o salário para aqueles que acumulam funções (a nossa amiga da Folha que é “redapórter”, por exemplo, teria o direito ao adicional de 40% no seu holerite).
Porém, para outras localidades, se não houver previsão na Convenção Coletiva, vai depender muito da cabeça do juiz. A boa notícia é que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) já tem julgamentos entendendo que, como a função de jornalista é análoga ao de radialista, ele fará, sim, jus ao adicional se acumular várias funções.
Foi o caso de uma jornalista da TV RBS, de Santa Catarina, pauteira e editora, que consolidou o novo entendimento dos ministros da 3ª Turma (RR-3542-2004-034-12-00.8). Anteriormente, uma jornalista, também editora e pauteira do ‘Bom Dia Santa Catarina’, já havia conseguido o adicional da lei dos radialistas, por analogia.
Somente levando essas situações aos tribunais é que vamos conseguir fazer com que as empresas pensem duas vezes antes de sobrecarregar os jornalistas com várias funções – sem pagar um centavo sequer a mais por isso.
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Kiyomori Mori. Advogado e jornalista (MTB/SP 37019). Sócio do escritório Mori e Costa Teixeira Sociedade de Advogados, atuante no Estado de São Paulo, na defesa dos direitos trabalhistas, autorais e de responsabilidade civil de jornalistas. Editor do blog Direitos dos Jornalistas. Foi um dos colaboradores do projeto educacional Para Entender Direito, em parceria com a Folha de S. Paulo. Membro do Conselho de Mantenedores da Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo.
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