A jornalista Maria Teresa Cruz está sendo processada criminalmente por representantes das construtoras Cyrela e Setin, proprietárias do terreno conhecido como Parque Augusta em São Paulo (SP). A ação criminal é por dano e as empresas alegam que a jornalista quebrou um dos tapumes metálicos que fechavam o local para fazer uma reportagem, em maio de 2016. O advogado Daniel Biral, ativista pela implementação do parque e que a acompanhava durante a reportagem, também está sendo processado sob a mesma alegação.
As empresas entraram com o processo em outubro de 2016, mas as intimações só chegaram no endereço correto de ambos no início deste ano. Para a jornalista, a ação é uma retaliação ao seu trabalho jornalístico. “[A indenização que eles pedem] é um valor pequeno, mas que dá muita ‘dor de cabeça’ para quem está sendo processado”. Em audiência no início de fevereiro, as construtoras propuseram que fossem pagos R$ 2.780 como reparação ao dano ao tapume, mas o acordo não foi aceito.
No vídeo, Cruz e Biral pulam os tapumes que cercam a parte de interesse público do terreno — onde as empreiteiras não podem construir — e mostram o estado de conservação do local. O material foi postado no canal de Cruz no YouTube, “Cenas da Cidade”, e replicado no blog homônimo hospedado no Portal Terra.
As imagens não mostram evidências de que a dupla teria quebrado algum dos tapumes. As empreiteiras não questionaram judicialmente o conteúdo do vídeo, e a acusação se limita ao suposto dano ao tapume.
A última audiência do processo ocorreu em meados de março. A expectativa era de que o julgamento da questão ocorresse nessa audiência, mas o representante do Ministério Público pediu vistas do processo. O prazo para que o MP emita um parecer é de 60 dias. Segundo Cruz, tanto ela quanto Biral estão otimistas pela absolvição, já que consideram não haver provas para sustentar a acusação.
Questionadas sobre as motivações do processo judicial, tanto a Cyrela quanto a Setin declararam que não comentam casos ainda em trâmite de julgamento.
O terreno de cerca de 24 mil metros quadrados no centro da cidade de São Paulo é alvo de disputas desde a década de 1970. Em 1969, o Colégio Des Oiseaux, que ocupava o espaço, fechou as portas. Cinco anos mais tarde, o prédio foi demolido e, desde então, a área já teve usos diversos, entre eventos culturais e o funcionamento de um estacionamento, e vem sendo reivindicada por movimentos sociais e associações de moradores.
Em 2002, o Plano Diretor do município previu a implantação do Parque Augusta no local. Em 2004, a área foi tombada pelo Conpresp, o órgão municipal de proteção ao patrimônio. Em 2008, o então prefeito Gilberto Kassab declarou a utilidade pública do terreno, enquanto a Conpresp autorizou a construção de prédios em um pedaço do local.
Em dezembro de 2013, o decreto de utilidade pública venceu e não foi renovado. Os movimentos sociais passaram a pressionar a prefeitura e, no mesmo mês, o então prefeito Fernando Haddad sancionou a lei que cria o Parque.
Em 2015, a Conpresp aprovou o novo projeto das construtoras Setin e Cyrela. A partir daí, o movimento “Parque Augusta Sem Prédios” começou a atuar mais intensamente, culminando na ocupação do terreno em 17 de janeiro daquele ano. No início de março, a Justiça determinou a reintegração de posse e pouco depois as construtoras ergueram tapumes para cercar o local. A área permaneceu fechada, à despeito de determinação do Tribunal de Justiça de São Paulo. Foi esse o gancho da reportagem de Maria Teresa Cruz.
Em 2017, a Prefeitura anunciou que cederá um terreno na região de Pinheiros para as construtoras, ficando o espaço no centro da cidade totalmente destinado para a implantação do parque. Os terrenos estão em fase de perícia judicial para acertar o valor que as empreiteiras pagarão em contrapartida pela troca da área da Augusta pela de Pinheiros.
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