Considerações sobre a reportagem de capa da revista Época com entrevista de Joesley Batista
O editor-chefe da revista Época, da Editora Globo, Diego Escosteguy, conseguiu uma entrevista exclusiva com o delator e presidente da J&F, holding da JBS, Joesley Batista. O depoimento foi dado antes do empresário prestar novo depoimento à Polícia Federal, incriminando ainda mais o presidente Michel Temer e chamando-o de “chefe da quadrilha mais perigosa do Brasil”.
A reportagem tem 12 páginas e alguns trechos emblemáticos.
Diz Joesley: “A pessoa a qual o Eduardo [Cunha] se referia como seu superior hierárquico sempre foi o Temer. Sempre falando em nome do Temer. Tudo que o Eduardo conseguia resolver sozinho, ele resolvia. Quando ficava difícil, levava para o Temer. Essa era a hierarquia. Funcionava assim: primeiro vinha o Lúcio [o operador Lúcio Funaro]. O que ele não conseguia resolver pedia para o Eduardo. Se o Eduardo não conseguia resolver, envolvia o Michel”.
No Código Penal Brasileiro, o crime de Formação de Quadrilha é especificado da seguinte forma no artigo 288:
“Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes”.
Os crimes de Michel Temer que constam nas acusações dadas em entrevista à revista Época e em sua delação premiada enquadram perfeitamente no delito descrito. Mas a publicidade do “chefe de quadrilha” decorre de outro fator. Dois políticos do PT foram acusados de formação de quadrilha e um deles foi condenado no Mensalão: Luiz Inácio Lula da Silva e José Dirceu.
A publicidade dada na imprensa mostra que a exposição do político por Joesley obedece o mesmo modus operandi dos ataques ao Partido dos Trabalhadores. E por que falo em ataques?
O crime de formação de quadrilha é amplo e pode abarcar uma série de ações continuadas – uma quadrilha que faz assaltos a bancos, por exemplo. A corrupção no governo federal, no Congresso, no Senado, nos governos estaduais e nas prefeituras tornou-se um método de gestão, algo mais sofisticado do que os delitos que constam nas leis. Enquadra-se, sim, como organização criminosa. Mas tratar Michel Temer como o chefe da ORCRIM (organização criminosa) mais “perigosa” do país é um reducionismo da questão, cujo valor é temporário.
Joesley Batista relata achaques feitos por Eduardo Cunha, ações autônomas do ex-presidente da Câmara que hoje está preso e o respeito a uma hierarquia cujo chefe é Temer na época do impeachment. O empresário também explica que o ex-ministro Geddel Vieira Lima tornou-se seu interlocutor quando Cunha foi preso. Depois as questões foram tratadas com Moreira Franco e com Michel Temer.
No entanto, reduzir o presidente da República a um chefão de uma quadrilha é pouco.
É como chamar Lula de chefão do Mensalão e do Petrolão. E é como os petistas adoram chamar Fernando Henrique Cardoso do chefão dos crimes do PSDB. Tudo isso é muito pouco. E todos estes políticos conversam entre si, possuem operadores para determinadas ações ilegais e tomam de assalto o dinheiro público para perpetuação no poder.
A discussão sobre os crimes dos nossos chefes de Estado precisa sair apenas das designações legais de seus processos jurídicos.
Temer é golpista e participante da corrupção do PMDB. Chefe de quadrinha é pouco para ele.
Texto publicado originalmente na plataforma Storia.