Apurar, cobrar, participar e engajar… O bom jornalismo é tema de artigo especial do jornalista Marc Tawil para o Portal Comunique-se
O jornalismo de qualidade vive um paradoxo. Ao mesmo tempo em que vê redações minguarem mundo afora, há décadas não tinha um protagonismo como o atual – e em nível mundial. Graças à infindável multiplicação de notícias falsas, ou fake news, e à propagação de versões, em detrimento dos fatos, o bom jornalismo vive uma fase de alta relevância.
A guerra de notícias falsas, de argumentação pobre e espalhamento rápido, aliada à abundância de canais de informação, devolveu ao jornalista um papel de destaque junto ao leitor, massacrado diariamente por todo tipo de conteúdo e seus congêneres.
Apurar, cobrar, participar e engajar, atribuições jornalísticas por excelência, estão novamente na ordem do dia.
Por outro lado, os profissionais vêm encontrando muros mais altos e reforçados, erguidos curiosamente por aqueles que trazem, entre suas bandeiras, a combalida liberdade de expressão como valor basal.
Incrivelmente, a desmoralização da verdade não parte apenas do “jornalista marrom” ou de grandes grupos de mídia. A mentira e o caos também partem dos gabinetes oficiais e dos smartphones dos principais líderes mundiais.
Vide Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, que acaba de postar um vídeo em que simula a agressão a um homem com um rosto coberto pelo logotipo da CNN. Trump, aliás, é famoso por alimentar seu Twitter com grosserias e xingamentos diários direcionados a aqueles que o fiscalizam, em grande medida, os meios de comunicação.
É evidente que a revolta de Trump é uma forma de combater aqueles que denunciam seu governo preconceituoso e desastrado. Uma guerra recheada de episódios tacanhos, como cancelamento de coletivas, impedimento da entrada de jornalistas de grandes veículos na Casa Branca (New York Times, BBC, Los Angeles Times e CNN, entre outros) e ofensas diária à imprensa, para ele, uma “inimiga do povo” e a “semeadora do caos”.
“São tempos difíceis para os jornalistas dos Estados Unidos, e não apenas porque tem sido uma luta substituir os modelos de negócios do século XX, mas porque desde o início da campanha os repórteres são assediados, ameaçados e até mesmo presos ao fazerem seu trabalho”, relatou Will Bunch, em notícia trazida pelo jornal O Globo. “A equipe de Trump tem construído, a cada tijolo, um muro contra a liberdade de imprensa”.
Pessoalmente, não acredito que Trump seja a semente do ódio à liberdade de expressão, e sim o reflexo da sociedade. Há algum tempo, o jornalista e o jornalismo já não estão sozinhos a brigar pela informação. Pior: a aura de isonomia que pairava sobre a classe deu lugar a uma sombra de profissão escolhida por puro idealismo, profissão que mais desemprega do que emprega, que paga mal e exige muito.
É mais bacana, mais divertido e mais rentável ser “influenciador”.
Resgato aqui uma entrevista com Mirna Feitoza concedida ao portal Amazônia Real. Jornalista, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Amazonas e doutora em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Mirna questiona o papel das grandes corporações no jornalismo. E crava que empresas jornalísticas tradicionais é que estão em crise, e não o jornalismo – cada vez mais fértil.
“Este modelo (empresarial) está se esgotando, assim como a indústria e a sociedade de consumo. Por outro lado, o jornalismo, enquanto prática cultural e humana, nunca esteve tão fértil. São várias as iniciativas jornalísticas que surgem a partir de coletivos de ativistas e de jornalistas empreendedores que passam a impactar a opinião pública”, diz ela.
Mirna lembra que a matéria-prima do jornalismo não é mais monopólio das empresas jornalísticas: “A notícia se descolou das empresas jornalísticas e também chega à opinião pública. Isto, sim, é transformador, pois pressupõe também uma mudança profunda na cultura: a forma como nos comunicamos mudou drasticamente com os meios e redes digitais. Neste sentido, a crise no jornalismo é inventiva, desafiadora e muito inquietante”.
É inovar ou morrer.
E quer saber? Estou com ela.
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