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Pandemia de Covid-19 pode gerar casos de estresse pós-traumático

São Paulo 8/6/2020 – Acontecimentos traumáticos podem simplesmente congelar em áreas específicas de memória do cérebro, e se recusam a “ir embora” somente com o esforço pessoal.

Talvez tão antiga quanto a história da humanidade sejam as conseqüências psiquiátricas da exposição humana ao trauma. Um desses traumas pode ser a exposição a pandemias mortais, como a de coronavírus, que acontece agora no mundo todo.

“Embora as consequências emocionais da exposição a traumas sejam descritas há muitos anos, tanto na literatura popular como técnica, foi somente em 1980 que o conceito de Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) foi introduzido”, explica o médico psiquiatra Cyro Masci. Segundo ele, a partir daí organizou-se e sistematizou-se uma variedade de conceitos como o “choque nervoso”, a “fadiga de batalha”, o “trauma emocional” e a “neurose traumática”.

De acordo com o especialista, a possibilidade de uma pessoa sofrer do estresse pós-traumático começa a partir do momento em que tenha vivenciado, testemunhado ou mesmo tenha sido confrontada com um ou mais acontecimentos que envolveram morte ou grave ferimento, reais ou ameaçados”, afirma. A ameaça à integridade física própria ou de outros indivíduos e que em resposta tenha-se sentido medo intenso, impotência ou horror também pode causar o TEPT.

Isso, segundo ele, inclui situações como desastres naturais ou provocados pelo homem, ser vítima de um assalto ou seqüestro, ou ainda presenciar um crime, especialmente se teve contato inesperadamente com ferimentos graves ou morte.

“Como resultado dessa situação, essa pessoa passa a reviver, de modo persistente, o acontecimento”, diz Cyro Masci. Em outras palavras, a pessoa é impedida de esquecer o que se passou já que é literalmente invadida por recordações aflitivas, pensamentos ou imagens, ou ainda sonhos bastante desagradáveis, tendo sempre como tema momentos da situação traumática.

O quadro também pode levar a sentir ou agir como se o evento traumático estivesse acontecendo novamente, seja sob a forma de um sentimento de reviver a experiência, episódios de vívida recordação, ilusões ou até mesmo alucinações. “O paciente ainda pode apresentar intenso sofrimento emocional ou sintomas corporais de estresse quando é exposto a indícios internos ou externos que simbolizam ou lembram algum aspecto do evento traumático”, exemplifica o psiquiatra.

Em geral, as pessoas que estão desenvolvendo o quadro passam a evitar de qualquer maneira toda e qualquer situação que possa lembrar do fato traumático. “O paciente passa a evitar de toda forma pensamentos, sentimentos ou conversas associadas ao trauma, realizando grandes esforços para evitar atividades, lugares ou pessoas que lembrem a situação. Como consequência, pode desenvolver grande incapacidade de recordar algum aspecto importante do trauma”, acrescenta Cyro Masci.

Outros sintomas

Também podem ocorrer sintomas de excitação, como dificuldade em adormecer ou manter o sono, irritabilidade ou crises de raiva, dificuldade de concentração, ou resposta de sobressalto exagerada.

“Para que seja realmente um quadro de estresse pós-traumático, esses sintomas devem estar presentes há no mínimo um mês, causando sofrimento significativo, prejuízo profissional ou em outras áreas importantes de funcionamento da vida da pessoa”, informa o psiquiatra.

Os sintomas podem ocorrer em qualquer idade. No geral, tem início nos três primeiros meses após o evento traumático, mas pode ocorrer um intervalo assintomático de meses ou mesmo anos. Segundo Cyro Masci, tanto o aparecimento quanto o curso do transtorno podem ser influenciados por experiências na infância, variáveis da personalidade, passado de outros transtornos e suporte social e história familiar. “Pode se desenvolver em pessoas sem nenhum fator predisponente, em especial se o estressor for particularmente extremo”.

O TEPT é de curso crônico, com apenas 50% dos pacientes tendo remissão espontânea nos primeiros dois anos após o incidente, e a maioria dos que não se recuperam permanecem com sintomas por 15 ou mais anos.

Transtornos associados

De forma geral, o quadro é acompanhado de outros transtornos psiquiátricos, incluindo depressão, transtorno de pânico, ansiedade social e abuso de substâncias. “O custo social também é alto. Indivíduos que sofrem desse problema têm índices maiores que a população geral de dificuldade escolar, dificuldade no trabalho e de relacionamento interpessoal”, acrescenta o médico.

Ele explica que, embora o TEPT seja menos estigmatizante que outros transtornos psiquiátricos, já que seus sintomas são considerados popularmente uma conseqüência natural frente a eventos traumáticos, ainda poucas pessoas recebem auxílio adequado, seja por falta de profissionais habilitados para prestar assistência, seja por minoração da importância dos sintomas.

Entre 1,3 a 9 em cada 100 pessoas no mundo todo acabam desenvolvendo o transtorno de estresse pós-traumático. Isso sem considerar populações de risco, como vítimas de violência criminal, quando as taxas pulam para até 58%. Sabe-se também que quando ocorrem múltiplos acontecimentos traumáticos, a incidência dobra.

“O fundamental aqui é ressaltar que sofrer desproporcionalmente após um acontecimento traumático é uma doença, que merece tratamento, e não ser considerado uma consequência natural”, enfatiza Masci. E acrescenta: “Muitas vítimas acabam ouvindo conselhos bem-intencionados de que devem tentar esquecer o que passou, mas simplesmente não conseguem”.

A realidade, segundo ele, é que os acontecimentos traumáticos podem simplesmente congelar em áreas específicas de memória do cérebro, e se recusam a “ir embora” somente com o esforço pessoal. “Nesse momento, há necessidade de tratamento adequado”, completa o psiquiatra.

 

Fonte: Cyro Masci, médico psiquiatra em São Paulo, autor dos livros “Síndrome do Pânico: Psiquiatria com abordagem integrativa” e “Biostress: Novos caminhos para o Equilíbrio e a Saúde”.

Outras informações: https://bit.ly/34mE498

 

 

Website: https://www.masci.com.br/

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Anderson Scardoelli

Jornalista "nativo digital" e especializado em SEO. Natural de São Caetano do Sul (SP) e criado em Sapopemba, distrito da zona lesta da capital paulista. Formado em jornalismo pela Universidade Nove de Julho (Uninove) e com especialização em jornalismo digital pela ESPM. Trabalhou de forma ininterrupta no Grupo Comunique-se durante 11 anos, período em que foi de estagiário de pesquisa a editor sênior. Em maio de 2020, deixou a empresa para ser repórter do site da Revista Oeste. Após dez meses fora, voltou ao Comunique-se como editor-chefe, cargo que ocupou até abril de 2022.

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