Eles choram diante das câmeras, não se aguentam, homens e mulheres, profissionais gabaritados ou “focas”, iniciantes, como vimos tantas vezes essa semana em mais essa tragédia pavorosa na serra fluminense. Não conseguem se conter, nem poderiam. Estão ali, com os pés afundados na lama, muitas vezes sem dormir, sem comer, e muito menos ganhar bem para isso. Acompanham as equipes de resgate, consolam familiares, veem corpos sendo retirados de escombros. Crianças mortas, perdidas, órfãos. Destroços. Nunca mais vão esquecer essas cenas, acredite. São imagens e histórias que nos marcam para sempre.
Poderiam também ser as suas próprias histórias. Conheceram algumas das vítimas.
Não são só essas grandes tragédias que fazem parte do dia a dia dos repórteres. Ainda na última semana, dia 16, foi comemorado o Dia do Repórter, entre tantos dias que se comemora a imprensa, dia disso, dia daquilo, mas pouco se valoriza de verdade. Nas ruas são profissionais que sofrem — e têm sofrido ainda mais ultimamente e com o incentivo do atual desgoverno — ataques de todos os tipos.
Vimos repórteres em portas de hospitais e UTIs, muitas vezes eles próprios com seus familiares doentes ou internados. Ou mortos — Marli Gonçalves
Volto ao esse tema porque tenho dois amigos internados em UTIs em Brasília exemplo disso, e do que viver essa nossa profissão pode causar na saúde. Dois dos maiores repórteres fotográficos de nosso tempo, Orlando Brito e Dida Sampaio, estão lutando por suas vidas. Brito, com graves problemas gastrointestinais; Dida teve um AVC. Autores de imagens que marcarão para sempre nossa história, quem os acompanha sabe o que passam na cobertura política, enfrentando agressões inclusive físicas de malucos de verde e amarelo, que deveriam estar sim em cercadinhos, onde se aglomeram para glorificar o tal mito inexistente, mas as grades deveriam estar bem fechadas, com cadeados, para que nós, a sociedade, pudéssemos estar protegidos de suas sandices.
Nos últimos dois anos de pandemia, vimos repórteres em portas de hospitais e UTIs, muitas vezes eles próprios com seus familiares doentes ou internados. Ou mortos. Temos sabido de muitos afastamentos do trabalho, por estresse ou pelo seu acúmulo máximo, a Síndrome de Burnout, a exaustão extrema. Não sabemos se eles têm tido acolhimento de suas empresas. Sabe-se sim, diariamente, mas é do passaralho voando nas redações, com demissões de alguns dos melhores; alguns por estarem sendo considerados “velhos”, e que levam com eles a experiência histórica do que já presenciaram em suas vidas.
Jamais esqueci trabalhando em grandes veículos os diversos momentos da vida de repórter em situações de grande pressão — Marli Gonçalves
Comecei muito cedo na profissão, onde já somo 45 anos como jornalista. Há alguns anos afastada desse afã do dia a dia, com o trabalho voltado para o site e em comunicação e consultoria empresarial, jamais esqueci trabalhando em grandes veículos os diversos momentos da vida de repórter em situações de grande pressão, como rebeliões em presídios, acidentes, crimes violentos, protestos, mortes de personalidades, embates políticos ainda na ditadura. Sobrevivi a chefes sentados confortavelmente em suas cadeiras. Sobrevivi ao preconceito contra mulheres nesse trabalho — vocês nem imaginam a dimensão! Fui moldada nessa batalha.
E ainda sinto na pele como se estivesse em cada situação dessas enfrentada pelos colegas no front.
Sinto-me no dever de honrá-los e defendê-los. De aplaudir e torcer para que sejam fortes. E rezar para que se recuperem de tudo isso que nos mata internamente, nos deixa doentes. Do corpo e da cabeça.
Respeitem a imprensa. E as equipes de reportagem nas ruas.
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