A Omo, marca pertencente à multinacional Unilever, lançou vídeo no Facebook como parte de sua campanha #momentosquemarcam, convidando os pais
Publicidade é comunicação. Qualquer comunicação? Não, ela é direcionada a um fim bem específico: vender um produto, um serviço, uma marca. Há interesse econômico na publicidade, ou seja, ao fim e ao cabo, o desejo do anunciante e do publicitário é lucrar.
Não se pode negar que a publicidade, seja qual for o meio de veiculação, tem o papel de quebrar barreiras, apresentar inovações, reconhecer mudanças sociais etc. Ao longo de sua história a publicidade desempenhou esta importante missão de romper paradigmas e barreiras culturais.
Mas há limites!
A Omo, marca pertencente à multinacional Unilever, lançou vídeo no Facebook como parte de sua campanha #momentosquemarcam, convidando os pais a refletirem sobre os estereótipos de gênero quando o assunto é brincar. Fez isso por ocasião do Dia das Crianças. No vídeo as afirmações “brincar de casinha é coisa de menina” e “andar de skate é coisa de menino” são seguidas de uma proposta: “deixe seu filho explorar e brincar livremente”.
Embora boa parte do público tenha apoiado a campanha, uma parcela considerável de consumidores não gostou nem um pouco da mensagem, acusando-a de querer impor uma forma de ser quanto às questões de gênero.
A Omo piorou a situação. No YouTube e no Instagram inseriu mensagem com um aspecto de, digamos, querer ‘passar um sabão’ no consumidor (piada pronta, considerando o anunciante). Deu muito errado, é claro!
A mensagem divulgada nestas duas redes sociais teve o seguinte conteúdo:
“Omo convoca os pais e mães a fazerem recall de todas as brincadeiras que reforcem clichês sobre gênero. Meninas podem, sim, se divertir com minicozinha ou minilavanderia. Mas também podem ter acesso a brinquedos de lógica e dinossauros assustadores. E meninos podem trocar fraudas de bonecas e ter uma incrível coleção de panelinhas. Porque mais importante do que o brinquedo é a brincadeira. Junte-se à Omo na campanha pelo direito de toda criança de se sujar e brincar livremente.”
A mensagem está errada por vários motivos. Falta-lhe coerência. Vejamos:
- É, sim, impositiva. “Convocar os pais a um recall” está, a um só tempo, impondo uma conduta e declarando que a visão dos pais quanto à criação dos filhos é ultrapassada. Afinal, recall é expressão que sugere a manutenção de algum que está estragado, não é? Havendo dúvida, basta consultar o art. 10, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor.
- Acertam ao dizer que mais importante que o brinquedo é a brincadeira. Mas erram ao querer estabelecer a quais tipos de brinquedos as meninas e os meninos devem ter acesso. Afinal, não foram eles mesmos que estabeleceram que mais importante que o brinquedo é a brincadeira? E porque, então, querem estabelecer a qual brinquedo meninas e meninos podem ter acesso?
- Ao dizer que meninas podem brincar com brinquedos de lógica, estariam dizendo que os brinquedos dos meninos são mais ‘inteligentes’ do que os das meninas? Isso nos levaria à conclusão de que os meninos que têm coleções de panelinhas estão ‘emburrecendo’? Esse tipo de argumento não cria um clichê, ao invés de evitá-lo?
- Por fim, não é compreensível a proposta de se juntar a uma campanha que defende o direito da criança de se sujar, se não há, dentre as brincadeiras apontadas, nenhuma que envolva suar, rolar na areia ou mexer na terra. A não ser que tenham receio de que os meninos possam se sujar ao trocar fraldas de bonecas!
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Por Jean Caristina. Doutor e Mestre em Direito Econômico pela PUC/SP. Graduado em Direito pela FMU/SP. Coordenador do Curso de Direito da UNINOVE/SP. Professor Universitário. Advogado. Articulista do site intervalolegal.com.br. Atua em relações jurídicas da publicidade, com foco no Direito do Consumidor e na proteção do direito constitucional da livre expressão e comunicação.