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Mistério e história em livro de jornalista

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Maria Helena Tachinardi apresenta resenha sobre o livro do jornalista Eumano Silva. A Morte do Diplomata: um mistério arquivado pela ditadura é publicado pela Tema Editorial

A Morte do Diplomata: um mistério arquivado pela ditadura, do jornalista Eumano Silva (Tema Editorial, Brasília, 2017), é um livro que, apesar de relatar acontecimentos da década de 1970, será sempre contemporâneo. A obra trata do mistério envolvendo a morte do diplomata mineiro Paulo Dionísio de Vasconcelos, em Haia, na Holanda, no verão europeu de 1970, quando o ditador Emílio Garrastazu Médici dirigia os rumos do país e o aparato de repressão aos opositores do regime militar. Foi um dos governos que mais torturaram e desapareceram com militantes de grupos de esquerda.

Neste mês de maio de 2018, quase 50 anos após aqueles duros e tristes tempos de censura à imprensa, perseguições e medo, a mídia repercutiu com destaque um documento da CIA (agência de inteligência dos EUA), aberto à consulta pública em 2015, mas somente agora divulgado no Brasil. O memorando informa que o general Ernesto Geisel, presidente da República de 1974 a 1979, sabia sobre execuções a opositores durante a ditadura e as autorizava, configurando-se essas ações como política de Estado.

O alarde em torno dessa notícia se deu porque Geisel sempre foi conhecido como o general da abertura lenta, gradual e segura e que destoava do antecessor Médici, em cujo governo houve o endurecimento do regime. Na sequência da informação da CIA e a pedido de Ivo Herzog, presidente do Conselho do Instituto Vladimir Herzog, o jornalista assassinado no período Geisel, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) quer obter do governo norte-americano os documentos produzidos pela CIA sobre operações de tortura e morte de brasileiros.

“Eumano Silva se revela um pesquisador minucioso, um historiador, além de um excelente ficcionista policia”

Quem lê o livro de Eumano Silva tem uma boa visão da época da ditadura militar no Brasil e em países sul-americanos; e sobre como a diplomacia brasileira colaborou com os órgãos de segurança do regime.

O livro sempre será atual. Não é apenas um relato jornalístico com um texto agradável, em que as palavras fluem de forma a envolver o leitor em um clima de mistério e suspense. A obra envolve muita história, palavra que em grego significa pesquisa, conhecimento advindo da investigação. Eumano Silva se revela um pesquisador minucioso, um historiador, além de um excelente ficcionista policial.

Quando comentei com um diplomata que ocupou o principal posto em embaixadas do Brasil na Europa e nos Estados Unidos sobre a colaboração do embaixador em Londres, Sergio Corrêa da Costa, no sentido de “propagar na Europa as preocupações com os inimigos do governo militar” (texto reproduzido do livro), a resposta foi que era preciso cumprir ordens. Muito mais naquela época de autoritarismo do que certamente em tempos de democracia. O fato é que carreiras em que o respeito à hierarquia é um imperativo, como a militar e a diplomática, a obediência se impõe.

A riqueza do livro, além do clima de mistério em torno da morte de um diplomata em circunstâncias até hoje não esclarecidas, é a contextualização. O leitor aprende história, adquire conhecimento sobre rituais diplomáticos e classificação de informações sigilosas. Também fica por dentro da hierarquia no MRE e sobre fatos da chamada “guerra suja”. Eumano Silva não deixa pontas sem nós.

“A estrutura narrativa de A Morte do Diplomata é a de um romance policial”

A estrutura narrativa de A Morte do Diplomata é a de um romance policial. Investiga as causas do óbito e vai além. A obra associa o suposto suicídio do diplomata a explicações sobre métodos de acobertamento de crimes. No capítulo “História cobertura”, Eumano Silva explica…

“Os órgãos de repressão no Brasil usaram o artifício do suicídio forjado para acobertar execuções e óbitos sob tortura. (…) No jargão interno, policiais e militares denominam esse tipo de mentira de ‘história cobertura’. São artifícios criados para dissimular ações, facilitar disfarces ou encobrir identidades. O mesmo termo aplica-se quando um agente se infiltra entre inimigos e precisa inventar um passado que não desperte suspeitas”.

Mantendo o suspense até o final, o autor descarta a hipótese de uma execução consumada pelo aparato repressivo. Pois Paulo Dionísio não deixou pistas de que tenha atuado em alguma organização política no Brasil e no exterior. O livro, contudo, enfatiza que a família do diplomata se inquieta com o silêncio do Itamaraty sobre as mensagens post mortem; que “fornecem elementos suficientes para questionamento dos resultados da investigação da polícia de Haia”. Esta concluiu que Paulo Dionísio se suicidou.

“Percorrer as 205 páginas de A Morte do Diplomata é um exercício de puro prazer “

Percorrer as 205 páginas de A Morte do Diplomata é um exercício de puro prazer. Isso para quem gosta de livros de suspense. A construção da história vai deixando claro que se trata de “um mistério arquivado pela ditadura”.

Algumas das personagens me são familiares, pois cobri política externa em Brasília por onze anos, de 1985 a 1996. Sem contar que, como correspondente da Gazeta Mercantil em Washington, de 1996 a 1998, também acompanhei a vida diplomática brasileira e as relações internacionais do Brasil. Garimpei muita informação no Itamaraty para escrever diariamente para o jornal. Sei como foi importante saber lidar com as fontes para tornar públicos tantos assuntos delicados. Imagino como era difícil para os jornalistas, à época da ditadura, cobrir os temas da chancelaria. Embora se saiba que enquanto os militares censuravam os assuntos internos, promoviam a divulgação de ações da política externa.

A Morte do Diplomata é um bom livro para se entender como operou a diplomacia brasileira ao tempo dos militares.

a morte do diplomata - capa - eumano silva - jornalista - tema editorial
(Imagem: divulgação/Tema Editorial)

A Morte do Diplomata: um mistério arquivado pela ditadura

Editora: Tema Editorial
Autor: Eumano Silva
Páginas: 208
Preço: R$ 35,00 (site da editora)

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Por Maria Helena Tachinardi. Jornalista formada pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas e com mestrado em relações internacionais pela Universidade de Brasília (UnB). Trabalhou na extinta Gazeta Mercantil, sendo repórter de política e, posteriormente, correspondente em Washington, nos Estados Unidos. Atualmente, é editora da Revista Interesse Nacional.

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