Filho do radiojornalismo, o telejornalismo brasileiro nasceu no mesmo dia em que a TV começou oficialmente no país: 18 de setembro de 1950. O primeiro informativo surgiu dentro do programa inaugural ‘TV na Taba’: foi o boletim ‘Em Dia com a Política’, do jornalista Maurício Loureiro Gama. Ele trabalhava no Diário da Noite, veículo que, assim como a pioneira TV Tupi, também pertencia aos Diários Associados, grupo empresarial de Assis Chateaubriand.
Em depoimento ao Museu da Pessoa, Gama, falecido em 2004, lembrou o tema de sua primeira fala diante das câmeras: “O Jânio [Quadros] tinha brigado na Câmara Municipal e levou um murro na cara, levou uma bofetada na cara e saiu sangue, então o Jânio, aquele processo todo, e passava no rosto cheio de sangue dizendo assim: ‘É o sangue do povo!’, o Jânio era anarquista, ‘É o sangue do povo!’. E aquilo foi um sucesso e eu estava contando essa história na minha crônica das dez horas da noite, contei a história desse incidente, grave incidente na Câmara Municipal. E foi assim a primeira crônica”.
Depois disso, Maurício Loureiro Gama permaneceu na TV Tupi apresentando, às quintas-feiras, o programa ‘Vídeo Político’, que logo foi ampliado, tamanha era sua repercussão.
Após o ‘Vídeo Político’, entrava no ar aquele que é considerado o primeiro telejornal diário do Brasil: ‘Imagens do Dia’, com Ruy Rezende e Paulo Salomão. A locução, feita ao melhor estilo radiofônico de então, era ilustrada com pequenos registros captados com uma câmera Auricom carregada com filme 16 mm. Crítica publicada na edição de 17 de outubro de 1950 do Diário da Noite definiu o ‘Imagens do Dia’ como uma “uma curiosa e frutífera experiência de televisão e cinema”. Esse mesmo texto, cujo autor assinou apenas como “E. B.”, frisou que o noticiário sofria com a falta de tempo para produção. “No mesmo dia têm que descobrir os ‘assuntos’, filmá-los, revelá-los, cortá-los e — já quase em cima da hora da transmissão — anotar os comentários a fazer”. Tudo isso realizado, vale ressaltar, por apenas duas pessoas dispondo de uma só câmera.
Vários outros telejornais foram lançados nos anos 1950, como ‘Atualidades Montilla’, ‘Diário de S. Paulo na TV’, ‘Edição Extra’, ‘Reportagem Ducal’, ‘Telejornal Bendix’, ‘Telejornal Tupi’ e ‘Telenotícias Panair’. Nenhum deles, porém, fez tanto sucesso quanto ‘O Seu Repórter Esso’. Lançado em 1952, era a versão televisiva do radiojornal mais importante da época. Como ainda não existiam redes nacionais, cada cidade tinha o seu próprio ‘Repórter Esso’. No Rio de Janeiro, por exemplo, ficou marcado o trabalho de Gontijo Teodoro, que apresentou o programa durante quase duas décadas.
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Em termos de formato, a grande revolução do telejornalismo brasileiro se deu em setembro de 1963, quando surgiu, no Rio, o ‘Jornal da Excelsior’, que depois mudou de nome para ‘Jornal Cassio Muniz’ e, finalmente, para ‘Jornal de Vanguarda’. Marshall McLuhan, pensador conhecido por ter cunhado a frase “O meio é a mensagem” e a expressão “aldeia global”, era admirador desse noticiário, que recebeu o prêmio Ondas de melhor programa informativo do planeta em 1964. Criado por Fernando Barbosa Lima, o ‘Jornal de Vanguarda’ reunia, em um mesmo estúdio, mais de dez profissionais. Appe, Borjalo, Cid Moreira, Gilda Muller, Jacinto de Thormes, João Saldanha, Luís Jatobá, Millôr Fernandes, Newton Carlos, Sérgio Porto e Villas-Bôas Corrêa foram alguns dos que passaram pelo programa. Bom humor e criatividade permeavam o roteiro, que começava com as seguintes frases, lidas pelo tonitruante Sargentelli: “Está entrando no ar o seu ‘Jornal de Vanguarda’. O jornal de quem sabe compreender o mundo de hoje e ver o mundo de amanhã. Um jornal livre para brasileiros livres. Um show de notícias. Nossas câmeras são os seus olhos”. O recrudescimento da ditadura militar precipitou o fim do ‘Jornal de Vanguarda’, que ganhou um revival cerca de 20 anos mais tarde na Band. Fernando Barbosa Lima produziu mais programas antológicos, como ‘Abertura’, ‘Conexão Internacional’, ‘Japão: Uma Viagem no Tempo’, ‘Os Brasileiros’, ‘Programa de Domingo’ e ‘Xingu’.
Outra revolução na TV se deu em 1º de setembro de 1969. Neste dia, estreou o ‘Jornal Nacional’, primeiro noticiário ao vivo transmitido em rede no Brasil. Cid Moreira e William Bonner são os apresentadores com mais tempo de bancada: 27 e 24 anos, respectivamente. Dono de uma das maiores audiências da televisão mundial, o JN serviu de base para os outros telejornais diários lançados pela Globo, como ‘Amanhã’, ‘Bom Dia Brasil’, ‘Bom Dia Praça’, ‘Hoje’, ‘Hora Um da Notícia’, ‘Jornal da Globo’, ‘Jornal das Sete’, ‘Jornal Internacional’, ‘Jornal Nacional 2ª Edição’ e ‘Praça TV’. Em 1996, foi dado um novo passo: entrou no ar a GloboNews, primeiro canal brasileiro inteiramente dedicado ao jornalismo.
Enquanto isso, a Band, inaugurada em 1967, também consolidou os seus noticiários. O ‘Jornal Bandeirantes’, rebatizado em 1997 para ‘Jornal da Band’, está no ar há mais de quatro décadas e já foi apresentado por profissionais como Chico Pinheiro, Ferreira Martins, Joelmir Beting, Marília Gabriela, Paulo Henrique Amorim e Ricardo Boechat — maior vencedor do Prêmio Comunique-se e “Mestre do Jornalismo”. Foram muitos os programas informativos que passam ou passaram pela tela da Band: ‘1º Jornal’, ‘Acontece’, ‘Agrojornal’, ‘Atenção’, ‘Bandeira 1’, ‘Band Cidade’, ‘Band Notícias’, ‘Bora Brasil’, ‘Café com Jornal’, ‘Canal Livre’, ‘Dia Dia’, ‘Diário Rural’, ‘Dinheiro Vivo’, ‘Fogo Cruzado’, ‘Jânio de Olho no Mundo’, ‘Jornal de Domingo’, ‘Jornal da Noite’, ‘Jornal de Sábado’, ‘Jornal de São Paulo’, ‘Jornal do Rio’, ‘Linha de Frente’, ‘Realidade’, ‘Rede Cidade’, ‘Titulares da Notícia’, entre tantos outros. O canal pago BandNews foi lançado em 2001.
Fundada em 1953, a Record é a TV há mais tempo em atividade no país. ‘Mappin Movietone’, ‘Telejornal BCR’ e ‘Record em Notícias’, mais conhecido como “jornal da tosse”, marcaram os primeiros anos do canal. Depois que Edir Macedo comprou a Record, em 1989, a notícia foi transformada no principal ingrediente da programação. De segunda a sexta, mais de 12 horas por dia são ocupadas por telejornais, com ênfase em produções locais e populares. Em 2007, surgiu a rede aberta Record News.
Outra rede que contribuiu decisivamente para o telejornalismo brasileiro foi a Manchete. Quando nasceu, em junho de 1983, 23% da sua programação de segunda a sexta era composta por noticiários. A Globo, por sua vez, tinha 16%. O ‘Jornal da Manchete’ chegou a ocupar cerca de duas horas do prime time. Dedicava especial atenção às pautas políticas e econômicas, exibia reportagens mais longas que as de outros canais e abria espaço para comentários e entrevistas. Foi o primeiro telejornal brasileiro a adotar redação e switcher como cenário, em linha com o conceito de newsroom lançado pela CNN em 1980. Ganhou uma segunda edição no início da madrugada, outra à tarde, além de versões dedicadas à cultura, sob o nome de ‘Panorama’, e ao esporte, a ‘Manchete Esportiva’.
A rede da família Bloch promoveu outras inovações. Com o matinal ‘Repórter Manchete’, em 1987, antecipou na TV aberta o formato de programação que faria sucesso nos canais pagos de notícia. Já com o ‘Documento Especial’, apontou câmeras para lugares, pessoas e temas jamais mostrados. Por trás desses dois projetos, e de tantos outros, existiu a genialidade do jornalista Nelson Hoineff, falecido em 2019.
Ao longo dos anos, cresceu o espaço no vídeo para as grandes reportagens. O ufanista ‘Amaral Netto, o Repórter’ foi referência, mas o símbolo maior desse gênero é o ‘Globo Repórter’, lançado em 1973 com o nome de ‘Globo-Shell Especial’. Outro programa que precisa ser registrado é o ‘Globo Rural’, um dos melhores do mundo em sua categoria.
Televisão é uma mídia popular. E poucas redes expressam isso tão fortemente quanto o SBT. Conforme escrevi no livro Silvio Santos – A Trajetória do Mito, o jornalismo da emissora vive em ondas. Por diversas vezes, o SBT inovou. Exemplos disso foram o ‘TJ Brasil’, apresentado e editado por Boris Casoy, e o ‘Aqui Agora’, inspirado no argentino ‘Nuevediario’. Enquanto o primeiro trouxe opinião para o horário nobre, o segundo abriu caminho para atrações como ‘190 Urgente’, ‘Alerta Nacional’, ‘Balanço Geral’, ‘Brasil Urgente’, ‘Cadeia Nacional’, ‘Cidade Alerta’, ‘Na Rota do Crime’ e ‘Tempo Quente’. Outra iniciativa ousada do SBT foi apoiar, no fim dos anos 1990, o primeiro canal internacional de notícias em português. Ele se chamava CBS Telenotícias e acabou em 2000.
Misturar jornalismo com entretenimento, algo tão em voga na televisão atual, está longe de ser uma novidade. Flávio Cavalcanti já fazia isso quando trabalhava no ‘Noite de Gala’. Goulart de Andrade, com o seu ‘Comando da Madrugada’, e Gugu Liberato, no ‘Domingo Legal’, também. Mas foi o ‘Fantástico’, lançado em 1973, que levou a combinação entre informação e diversão para um patamar mais elevado tanto em termos editoriais quanto técnicos e estéticos. Era o tal “padrão Globo de qualidade” em todo o seu esplendor.
E agora, o esporte. Ele merece destaque especial. Tudo começou com o ‘Vídeo Esportivo’, quadro do programa inaugural ‘TV na Taba’. Baltazar, o Cabecinha de Ouro, foi o primeiro jogador de futebol a aparecer diante das câmeras da TV Tupi. Já a primeira partida transmitida pela Tupi paulistana aconteceu em pleno estádio do Pacaembu, na chuvosa tarde de 15 de outubro de 1950: Palmeiras 2 a 0 no São Paulo. O primeiro gol dessa partida foi marcado pelo ponta-esquerda Brandãozinho aos 28 minutos do segundo tempo.
Uma criação dos anos 1960 serviu de base para muitos dos programas esportivos feitos no Brasil: foi a ‘Grande Resenha Facit’, que Nelson Rodrigues definiu da seguinte forma: “Amigos, cada resenha Facit é uma pequena e luminosa lição de futebol e de vida. Balzac, se a ouvisse, havia de babar na gravata. Eis a verdade: na grande revista, o sujeito pode ver o ser humano em todos os seus abismos. E há momentos em que, acompanhando os nossos debates, o telespectador vai palmilhando todas as províncias da ingenuidade” (Jornal dos Sports, 9 mar. 1965, p. 4).
Nelson Rodrigues, tricolor apaixonado, era um dos debatedores do programa. Ele dividia a bancada com os botafoguenses Armando Nogueira e João Saldanha, o flamenguista José Maria Scassa e os vascaínos Vitorino Vieira e Ademir. Léo Batista, Mário Vianna e Washington Rodrigues também passaram pela ‘Grande Resenha Facit’, cuja mediação ficava a cargo de Luiz Mendes.
O esporte sempre mereceu lugar de destaque nas programações. ‘Globo Esporte’ e ‘Esporte Espetacular’, por exemplo, existem há mais de quatro décadas. Nenhuma rede, porém, dedicou-se mais a esse setor do que a Band. Com Luciano do Valle e Quico, ela virou “o canal do esporte”. Todas as modalidades, e não apenas o futebol, eram exibidas a qualquer hora do dia ou da noite. O carro-chefe foi o ‘Show do Esporte’: maratona dominical de eventos que chegou a ter 12 horas duração.
A TV nunca abriu tanto espaço à informação quanto agora. Plantões são cada vez mais frequentes. Noticiários ao vivo invadem a madrugada. Telejornais locais ganham mais espaço. Novos canais de notícia, como CNN Brasil e AgroMais, juntam-se a outros já consolidados. O presente e o futuro da televisão passam, em boa medida, pelo jornalismo.
Difícil resumir quase 26 mil dias de história em poucos parágrafos. Vários canais, eventos, programas e profissionais importantes não foram citados. Peço desculpas por isso. Este texto, porém, não teve a pretensão de esgotar um assunto tão rico. O objetivo foi simplesmente registrar algumas das produções jornalísticas mais importantes da televisão brasileira para, através delas, homenagear a todos que fizeram, fazem e farão do ato de informar pela TV a sua missão de vida.
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