A 15ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que começa nesta quarta-feira, 26, e vai até domingo, 30, homenageará o escritor carioca Afonso Henriques de Lima Barreto, nascido em 13 de maio de 1881 e morto aos 41 anos em 1º de novembro de 1922. A edição de 2017 também se destaca por ser a primeira em que o número de escritores convidados do sexo masculino é igual ao número de escritoras.
A curadora do evento, Joselia Aguiar, conta que a homenagem a Lima Barreto estava, há alguns anos, nos planos da organização. “Lima Barreto já estava nos planos da Flip há algum tempo”, disse. Embora seu nome tenha sido citado no final de 2013 entre os prováveis homenageados, as edições seguintes da festa destacaram Millôr Fernandes, Mário de Andrade e Ana Cristina Cesar.
“Era realmente o momento de trazer Lima Barreto, até porque o país e o mundo têm discutido bastante a questão racial. Era uma forma de contribuir para essas discussões”. Joselia esclareceu que embora essa questão tenha destaque na obra de Barreto, a Flip vai destacar toda a potencialidade do autor. “É uma feira com muita literatura em todos os gêneros que ele [Lima Barreto] exerceu. Tem uma pluralidade muito grande de autores e a ideia é trazer diálogos e debates novos, para que as pessoas tenham na Flip um estímulo para conhecer autores, livros e ficar um pouco mais a par de discussões contemporâneas”.
Lima Barreto perdeu a mãe, Amália Augusta, que era uma escrava liberta e professora, aos seis anos de idade. O pai, o tipógrafo João Henriques, tomou conta do menino e de outros três filhos mas, poucos anos depois, foi diagnosticado como neurastênico, ficando recolhido pelo resto da vida. A doença do pai fez Lima Barreto abandonar os estudos na Escola Politécnica para sustentar a família. Em 1903, iniciou vasta colaboração com a imprensa, publicando artigos e crônicas em jornais como o Correio da Manhã e o Jornal do Commercio.
Na revista Floreal, que fundou com amigos, iniciou a publicação do folhetim Recordações do Escrivão Isaías Caminha, que foi publicado em livro em 1909. Em 1911, publica, no Jornal do Commercio, Triste Fim de Policarpo Quaresma, que é editado em livro em 1915. Barreto pagou a edição com recursos próprios.
O alcoolismo e a depressão o levaram a ser internado pela primeira vez, em 1914. Seu estado de saúde piorou e ele se aposentou por invalidez em 1918, na Secretaria de Guerra, para onde havia feito concurso em 1903. No ano seguinte, publica o romance Vida e Morte de M.J. Gonzaga de Sá. Em 1921, tenta o ingresso, pela terceira vez, na Academia Brasileira de Letras (ABL), e desiste antes da votação.
O escritor foi homenageado no carnaval carioca de 1982 pela Escola de Samba Unidos da Tijuca, com o samba-enredo “Lima Barreto, mulato pobre mas livre”.
A edição da Flip deste ano é a primeira em que há paridade de gênero entre os convidados: são 23 autores do sexo feminino e 23 do sexo masculino. A curadora Joselia Aguiar lembra que até 2013, não se questionava a participação reduzida de mulheres na Flip. “Isso não era uma questão”.
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A partir de 2014, com o projeto ‘#readwomen2014 (#leiamulheres2014) da escritora inglesa Joanna Walsh, esse cenário começou a mudar. “Existem eventos na Colômbia, na Espanha, nos Estados Unidos que têm mais mulheres na programação, por uma visão de que há muita coisa nova para ser mostrada, há muitas novas vozes e possibilidades para serem mostradas”, comentou Joselia.
Joselia chama a atenção também para a participação de autores negros, que também aumentou. “São 30% de autores negros. Eu diria que os mais estrelados são eles”, observou. Dentre os representantes negros se destacam Marlon James, da Jamaica; Scholastique Mukasonga, de Ruanda; e os brasileiros Lázaro Ramos e Conceição Evaristo.
O número de mesas literárias também aumentou nesta edição da Flip. “Tem mais literatura desta vez, porque nos últimos anos, a Flip tinha mesas com outros temas, outras áreas do conhecimento”, comentou Joselia.
Existe também maior integração com outras formas de expressões artísticas. Muitos autores se conectam com outras artes, como o teatro, por exemplo. A abertura da Flip terá direção de cena de Felipe Hirsch e falará de Lima Barreto, com participação do ator e escritor Lázaro Ramos e da historiadora e antropóloga brasileira Lilia Schwarcz.
O show de abertura terá apresentação do pianista, compositor e arranjador brasileiro André Mehmari. A festa terá uma série intitulada Fruto Estranho, com intervenções poéticas e performáticas antes do início das mesas literárias. “Tem autores que também fazem letras de música, tem rapper que é ativista político”, disse Joselia.
Por decisão do diretor-geral da Flip, Mauro Munhoz, e da equipe de arquitetura e design da festa, a programação principal do evento ocorrerá na Igreja da Matriz, considerada patrimônio histórico nacional. Antes, ela ocupava a Tenda dos Autores. No redesenho da Flip 2017, a intenção é possibilitar que mais pessoas possam assistir de graça as apresentações. Para isso, foram instalados, no entorno da Praça da Matriz, 700 lugares cobertos para os visitantes.
Na Flipinha – com programação voltada ao público infantojuvenil, os autores convidados farão atividades lúdicas com estudantes. Os pequenos leitores terão encontros com escritores e ilustradores na Casa da Cultura Câmara Torres. Na Praça da Matriz, as árvores vão se transformar em “pés de livros”, exibindo obras literárias que ficam à disposição dos leitores mirins enquanto durante a festa. Da Central Flipinha, que é um espaço de encontro de crianças e jovens com os autores da Flip, sairão vários cortejos literários.
A Flip deste ano também será transmitida ao vivo pela internet. “É uma forma de acompanhar as discussões, conhecer os autores”. .
Outro ponto de destaque na programação da Flip 2017 é a Praça da Língua. A reconstrução do Museu da Língua Portuguesa, inaugurado em 2006 na Estação da Luz em São Paulo, e destruído por um incêndio em 2015, é tema de celebração na Casa de Cultura de Paraty. Ali, haverá uma instalação audiovisual que recria a experiência considerada símbolo do museu, que é a Praça da Língua. “Acho que vai ser um momento importante também”, disse Joselia.
“É uma Flip que tem mais lusofonia, no sentido de que vai ter mais autores de língua portuguesa, de Angola, de Portugal, e vai ser um momento importantíssimo de se conhecer a língua portuguesa, a história da língua, de ter uma apreensão da língua portuguesa”.
Iniciativa do governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Estado da Cultura, o Museu da Língua Portuguesa foi concebido e realizado em parceria com a Fundação Roberto Marinho. As atividades relativas ao museu são gratuitas e abertas ao público em geral. A mesa de abertura da exposição Praça da Língua será no dia 28, às 11h. A exposição vai além do período da Flip e ficará aberta ao público até 27 de agosto.
A programação completa está disponível na página do evento.
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