Criar conteúdo exclusivo para o Facebook, sem gerar tráfego para o site. Essa ideia parece não fazer muito sentido para os veículos de comunicação tradicionais, ainda mais se levar em consideração as constantes mudanças de algoritmo da rede social, que acabam por não priorizar as fan pages de conteúdo. Na tarde de ontem, quarta-feira, 7, visitei a sede do BuzzFeed Brasil para conversar com a editora-chefe Manuela Barem sobre os projetos da empresa para este ano – o que inclui a criação de conteúdo exclusivo para rodar no Facebook – e o atual momento do jornalismo no país. Horas depois, já na manhã desta quinta-feira, 8, a Folha de S. Paulo divulgou que está deixando a rede social de Mark Zuckerberg. Esta matéria fala sobre isso e apresenta a visão de Manuela Barem para o investimento que vai na contramão do que players de mídia e jornalistas estão fazendo.
O investimento do BuzzFeed Brasil em vídeos criados para o Facebook ganhou força em 2017. O conteúdo é pensado para a plataforma e distribuído genuinamente na rede social, sem gerar clique no site. Manuela Barem afirma que a decisão de investir neste modelo tem como foco o relacionamento do público com os materiais. “Atualmente, atingimos 60% dos brasileiros que estão ativos no Facebook”. Como vocês chegaram a esse número com tantas mudanças de algoritmo, questiono. “Ter audiência no site e engajamento no Facebook são estratégias paralelas. Entendemos que as duas são igualmente importantes e investimentos nos dois lados. O nosso foco é sempre o leitor e o relacionamento que ele vai ter com aquele conteúdo”.
O que a Manuela explica é que o BuzzFeed Brasil não depende meramente do algoritmo. “O conteúdo é feito para a rede social. Temos preocupação em criar coisas que as pessoas consigam se relacionar, ficar engajadas, que elas possam se expressar por meio das nossas publicações. O conteúdo que engaja as pessoas rompe barreiras. As pessoas precisam se importar com aquilo que está sendo oferecido”. Em 2017, além de chegar ao marco de “falar” com 60% das pessoas ativas no Facebok, o BuzzFeed Brasil cresceu 25% no tráfego do site. Os números de engajamento são assustadores. O BuzzFeed News, por exemplo, tem vídeo com mais de 15 milhões de visualizações e mais de 295 mil compartilhamentos, como este sobre a história de Eva Mozes Kor, que serviu de cobaia humana durante o holocausto.
Dicas de autodefesa para todas as mulheres é outro exemplo. Publicado na página BuzzFeed Pink, o conteúdo tem mais de 16 milhões de visualizações e mais de 380 mil compartilhamentos.
Trabalhar com o Facebook é o tema da vez dentro das redações, mas existem outras redes sociais. No BuzzFeed Brasil, as outras plataformas, como Instagram, YouTube, Pinterest e Twitter, também recebem planejamento e contam com conteúdo exclusivo, o que alterou, inclusive, o dia dos redatores. “Estamos em diversas redes sociais e isso é graças à publicitária Chris Dierkes (que em julho de 2017 foi contratada como social media da empresa). Organizamos os processos e criamos rotina de publicação diária nessas plataformas. Com isso, o nosso time de redatores passou a equilibrar o conteúdo do site com as outras mídias. Eles fazem posts, criam imagens e vídeos que entram diretamente nas redes”. Manuela garante que tem sido bem divertido trabalhar e criar coisas exclusivas para as plataformas e que, óbvio, o investimento seguirá em 2018.
Coincidentemente, o BuzzFeed Brasil divulgou nesta semana este texto sobre uma reportagem do G1.
A entrevista com a editora-chefe já estava marcada e aproveitei a ocasião para entender o que forma a decisão de apurar algo que já foi apurado e discutir sobre fake news. “Foi puro faro jornalístico. A nossa prioridade sempre é buscar informação de qualidade e, numa dessas, chegamos a essa história (que gerou a pauta do portal de notícias da Globo). O caso do G1 não é pessoal e nem de longe existe uma briga entre as redações. Nos preocupamos em ajudar as pessoas a terem debate mais maduro e a formarem opinião para que a discussão corra para um lado mais interessante”, explicou a jornalista. A reportagem do BuzzFeed Brasil gerou atualização na reportagem do G1.
No campo das fake news, Manuela Barem reforçou a política da empresa em abraçar o combate a esses materiais. “Temos treinamento para entender de onde as fake news saem, investigamos o que está por trás da construção desses textos e trabalhamos com reportagens que “respondem” às fake news, explicam de onde surgiu a informação falsa e todos os outros detalhes que envolvem a criação desse conteúdo.
Seja no caso do G1 ou das fake news, Manuela concorda que erro no jornalismo é sempre preocupante. “Mas, ao mesmo tempo, ninguém está protegido. Não é porque estamos tentando acertar que vamos julgar o trabalho da mídia tradicional. Todo mundo tem seu papel e jornalismo é difícil, é complicado errar e estar exposto a possibilidade todos os dias. Infelizmente, erraram na apuração. A gente torce para que não volte a acontecer”, comenta. Para Manuela Barem, o jornalismo no Brasil tem muito a amadurecer no sentido de não subestimar o leitor.
Comentei com a Manuela que, pelos relatos do BuzzFeed Brasil e os bons resultados divulgados por ela, parece que por lá não existe crise: nem no país, tampouco na profissão. Diante disso, pedi que ela comentasse erros que fizeram parte do trabalho em 2017. “Muita coisa vai mal! É do jogo. Encaramos as coisas como desafios e aprendizado para a próxima tentativa. A nossa cultura é de testar e aprender”, explica.
A editora-chefe reforça que o grande desafio do jornalismo, atualmente, é balancear a importância do jornalista, profissional capacitado para apurar. “Existe a declaração sobre a morte do jornalismo, falam que o jornalista não representa nada. Representa sim! A outra parte é: como fazer para que esse profissional tenha espaço, lugar e domínio de ferramenta para continuar fazendo o trabalho que é totalmente necessário na nossa sociedade. Esse é o desafio para quem administra um negócio de jornalismo”.
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