O relator do projeto de lei que trata do combate às fake news (PL 2630/20), deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), apresentou nova versão do texto nesta quinta-feira, 31 de março. A proposta deverá ser votada pelo Plenário da Câmara dos Deputados nos próximos dias.
A proposta busca aperfeiçoar a legislação brasileira referente à liberdade, à responsabilidade e à transparência na internet. As regras vão se aplicar a provedores de redes sociais, ferramentas de busca e de mensagens instantâneas que ofertem serviços ao público brasileiro, inclusive empresas sediadas no exterior, cujo número de usuários registrados no país seja superior a 10 milhões.
O grupo de trabalho (GT) da Câmara dos Deputados que analisou a matéria concluiu em dezembro do ano passado a votação do relatório. Uma das modificações do texto apresentado agora em relação ao aprovado pelo GT é a equiparação das mídias sociais aos meios de comunicação social para fins do cumprimento do artigo 22 da Lei de Inelegibilidade.
O artigo diz que qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá pedir abertura de investigação na Justiça Eleitoral para apurar uso indevido de meios de comunicação social em benefício de candidato ou de partido. “A equiparação das plataformas digitais a meios de comunicação serve apenas e somente para que a eficácia da Justiça eleitoral se dê plenamente quando houver o abuso na atividade nesses espaços”, disse Orlando Silva.
Conforme observado por Orlando Silva, o novo texto já foi encaminhado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e a expectativa do relator é que o requerimento de urgência para a matéria seja apreciado na próxima semana.
O relator destacou que, para elaborar o texto, fez reuniões com líderes e bancadas dos partidos na Câmara, com o Poder Executivo e com o Poder Judiciário, incluindo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre Moraes, relator do inquérito que investiga fake news. Além disso, segundo ele, foram ouvidos representantes das empresas e da sociedade civil.
Como a matéria voltará ao Senado, Silva também discutiu o texto com líderes no Senado; com o autor do projeto, senador Alessandro Vieira (PSDB-RS); e com o relator da proposta naquela Casa, senador Angelo Coronel (PSD-BA). O deputado considera que as mudanças foram bem recebidas. A expectativa do relator é de que inclusive a bancada governista vote favoravelmente à proposta, ressalvado os destaques das bancadas para votação de terminados pontos em separado. Ele espera que a votação seja concluída em abril.
Uma das modificações em relação ao texto do Senado foi a inclusão de dispositivo prevendo que a imunidade parlamentar em relação a opiniões será estendida às redes sociais.
A imunidade parlamentar material não serve para proteger nem abrigar crime nem criminoso
O relator ressalta que essa imunidade não impedirá a ação da Justiça. “O caso do deputado Daniel Silveira (União-RJ) é o melhor emblema para demonstrar que a imunidade parlamentar material não serve para proteger nem abrigar crime nem criminoso. É o exemplo cabal disso: um parlamentar ao tentar se abrigar na imunidade parlamentar viu a força da Justiça. O Poder Judiciário vai decidir o caso Daniel Silveira em função de crimes tipificados na legislação que versam sobre a defesa do Estado Democrático de Direito”, afirmou.
A proposta considera de interesse público, submetendo-se às regras e aos princípios da administração pública, as contas de redes sociais indicadas como institucionais pelos órgãos públicos e por agentes políticos. Essas contas não podem, por exemplo, bloquear usuários.
No novo texto, o relator deixa claro que, caso possua mais de uma conta em uma plataforma, o agente político ou servidor público indicará aquela que representa oficialmente seu mandato ou cargo ao respectivo órgão corregedor, sendo as demais eximidas das obrigações.
A proposta obriga os provedores a serem representados por pessoa jurídica no Brasil, o que afeta especialmente o aplicativo Telegram. O novo texto deixa claro que a representação deverá ter plenos poderes para responder perante as esferas administrativa e judicial; para fornecer às autoridades competentes informações; para cumprir as determinações judiciais; e responder a eventuais penalizações.
Não basta designar Bruno Góes como representante do Telegram no Brasil
“Saiu de uma mera representação formal para uma representação que seja capaz de cumprir determinações judiciais. Não basta designar Bruno Góes como representante do Telegram no Brasil. É necessário constituir pessoa jurídica para que essa representação dê capacidade e competência para defender as necessidades e demandas do Brasil”, esclareceu Orlando Silva.
O grupo de trabalho também incluiu no texto do Senado dispositivo para que os conteúdos jornalísticos utilizados pelos provedores sejam remunerados. A ideia é valorizar a informação produzida pelo jornalismo profissional como forma de combater a desinformação.
No novo substitutivo, o relator buscou deixar claro quem poderá ser beneficiado pela remuneração dos conteúdos jornalísticos — ou seja, empresa constituída há pelo menos um ano da publicação da lei, que produza conteúdo jornalístico original de forma regular, organizada, profissionalmente e que mantenha endereço físico e editor responsável no Brasil.
Conforme apontado por Orlando Silva, a ideia é valorizar quem tem sede e editor responsável no Brasil. Ele ressalta que há preocupação da mídia independente de que a remuneração seja concentrada em grandes meios de comunicação. O deputado promete buscar até o dia da apreciação da proposta no Plenário uma redação mais justa e exata.
Segundo o texto aprovado no GT, os provedores de redes sociais e de serviços de mensageria vão ter que elaborar e publicar relatórios de transparência semestrais com as principais ações tomadas no período. Orlando Silva explicou que modificou alguns itens que os relatórios de transparência deverão conter, já que “havia o temor de que determinadas informações publicadas poderiam facilitar a vida de agentes maliciosos”.
Ele remeteu ao Comitê Gestor de Internet (CGI.br) a possibilidade de requerer, por ato fundamentado, determinadas informações, que não seriam mais públicas.
O novo substitutivo diz que os provedores poderão criar instituição de autorregulação voltada à transparência e à responsabilidade no uso da internet. No texto antigo, a criação da instituição era obrigatória.
O relator explicou ainda que procurou calibrar as sanções e estabelecer limite para o valor por infração. O texto aprovado pelo grupo de trabalho prevê multa de até 10% do faturamento do grupo econômico no Brasil pelo descumprimento da lei. O novo substitutivo estabelece que, ausente o faturamento, a multa será de R$ 10 até R$ 1 mil por usuário cadastrado no provedor sancionado e que a multa será limitada, no total, a R$ 50 milhões por infração.
No novo texto, o relator fixa prazos diferenciados para o cumprimento dos diferentes dispositivos da lei. Ele estabelece prazo de um ano para a entrada em vigor de alguns dispositivos do texto, como a produção dos relatórios de transparência. Para outros pontos, o prazo de vigência será de 90 dias a partir da publicação da lei, caso aprovada.
Para outros ainda, a vigência será imediata, como as regras para a representação das empresas no Brasil e a equiparação das mídias sociais aos meios de comunicação social para fins da aplicação da Lei de Inelegibilidade. Segundo Orlando Silva, isso significa que essas regras poderão valer já para essas eleições, caso a proposta seja votada e publicada antes das eleições.
Essa lei pode ajudar a ter eleições mais seguras e confiáveis, a combater a desinformação
“Tenho convicção de que essa lei pode ajudar a ter eleições mais seguras e confiáveis, a combater a desinformação nos serviços de mensagem e a criar restrições para agentes públicos manejarem seus cargos e utilizarem estruturas públicas para servir à desinformação”, avaliou o relator.
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Reportagem: Lara Haje.
Edição: Geórgia Moraes.
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