A 9ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) negou o pedido de indenização do fotógrafo Sérgio Silva, que perdeu a visão do olho esquerdo após ser atingido por uma bala de borracha durante manifestação em junho de 2013.
O julgamento ocorreu na manhã de quarta-feira, 29. Apreciaram o recurso os desembargadores Rebouças Carvalho, relator do caso, Décio Notarangeli e Oswaldo Luiz Palu. A votação foi unânime.
Ainda que tenha admitido que o fotógrafo “não teve culpa” pelo que sofreu, o Tribunal considerou, com base em laudo pericial apresentado no processo, que não há comprovação de que o ferimento tenha sido causado por bala de borracha, excluindo-se o “nexo causal com o comportamento danoso do Estado”.
Para Rebouças Carvalho, o ferimento poderia ter sido causado por “pau, pedra, mão, cabeça, bolas de gude, bolas de futebol” e outros objetos. “Não basta a demonstração do dano, porquanto é imprescindível para a condenação a clara comprovação de que o agente público tenha produzido o apontado dano, o que no caso concreto não ocorreu”, sustentou.
Além disso, como Silva não registrou boletim de ocorrência na época do ferimento, o magistrado destacou que “não há qualquer relatório oficial dos fatos”.
“A ideia é ir para terceira instância, ir para um tribunal internacional”, declarou o fotógrafo após o julgamento. “O que se ouve em uma decisão dessa do Tribunal é de que você não tem prova de que foi bala de borracha que me cegou, que foi o agente do Estado que atirou… E fica a pergunta: quem manipula arma com bala de borracha? Quem promoveu a onda de violência naquela noite? Quais pessoas ficaram feridas?”
Silva foi ferido por um agente da Polícia Militar enquanto cobria uma manifestação do Movimento Passe Livre, na capital paulista, em 13 de junho de 2013. O dia foi marcado por episódios de violência policial.
Em entrevista à Ponte, o advogado do fotógrafo, Maurício Marques, disse que pediu para inserir mais provas, mas que não foi autorizado, porque o processo não foi devolvido à primeira instância.
Relembre
Dois meses após o protesto em que foi ferido, Sérgio Silva moveu uma ação pedindo que o governo paulista fosse responsabilizado pela agressão. O fotógrafo pediu indenização por danos moral, estético e material no valor de R$ 1,2 milhão. Também pediu pensão mensal de R$ 2,3 mil, acrescida de R$ 316 para custeios médicos.
No julgamento em primeira instância, em agosto do ano passado, o juiz Olavo Zampol Júnior negou o pedido do fotógrafo, argumentando que a culpa pela agressão era exclusivamente sua.
“A imprensa quando faz coberturas jornalísticas de situações de risco sabe que deve tomar precauções, justamente para evitar ser de alguma forma atingida”, registrou na sentença. “Ao se colocar o autor entre os manifestantes e a polícia, permanecendo em linha de tiro, para fotografar, colocou-se em situação de risco, assumindo, com isso, as possíveis consequências do que pudesse acontecer”.
A Abraji e outras organizações da sociedade civil se mobilizaram após a decisão, manifestando apoio ao fotógrafo e repúdio à sentença.
“[Zampol Júnior] omite qualquer responsabilidade do Estado em garantir que profissionais de imprensa exerçam seu ofício de informar a sociedade”, disse a associação na época. “Culpar o fotógrafo por ser cegado equivale a dizer que a vítima de um assalto mereceu ser roubada ou uma mulher, estuprada – além de ser óbvia ameaça à liberdade de imprensa.”
Na manhã de hoje, Sérgio Silva ainda afirmou que “o que está acontecendo agora legitima a ação da polícia naquela noite”.
Outros casos
O fotógrafo Alex Silveira perdeu parcialmente a visão do olho esquerdo ao ser atingido por bala de borracha durante a cobertura de um protesto em 2000. Como no caso de Silva, o disparo foi dado por um agente da Polícia Militar.
Silveira chegou a ter o pedido de indenização atendido em primeira instância, mas catorze anos depois o TJ-SP reverteu a decisão. “O autor colocou-se em quadro no qual se pode afirmar ser dele a culpa exclusiva do lamentável episódio do qual foi vítima”, disse o desembargador Vicente de Abreu Amadei, que julgou o caso naquele ano.
A Abraji contabilizou mais de trezentas agressões a jornalistas durante a cobertura de protestos desde junho de 2013.
Os últimos casos são de setembro, quando dois fotógrafos sofreram ataques da Brigada Militar do Rio Grande do Sul. Um deles foi detido durante a cobertura.