Parte da grande imprensa brasileira não entende porque estão definhando e muitas morrendo. Se vitimizam como se o único causador de sua perda de relevância seja a concorrência “desleal” da internet. A arrogância do pouco de poder que ainda lhe resta impede que façam mea-culpa com relação a sua grande responsabilidade pela crise pela qual passa.
A mais aparente é a queda significativa de qualidade devido à falta de investimentos. Ao invés de fortalecerem-se no seu principal diferencial, que poderia ser a qualidade do produto, vão justamente na direção contrária. A falta de investimentos e o desprestígio das redações dentro do organograma dessas organizações fazem com que, numa fome imediatista, comam a sua galinha dos ovos de ouro. São rotineiras as demissões em massa, assoberbamento dos poucos repórteres restantes, falta de autonomia, redução da média salarial, carga horária aumentada extraoficialmente, entre outras.
No entanto, existe um outro dano nesse modelo de negócio menos palpável, mas também de grande significância: a falta de comprometimento com transmissão dos fatos e identificação com os anseios e necessidades da sociedade. Isso ficou muito visível na cobertura deste sábado, das manifestações. Se no passado não era tão perceptível, por conta de ser praticamente a única voz, hoje suas omissões ficam gritantes em contraponto com as atuações das alternativas, mídias sociais e o maior acesso, através da internet, aos veículos internacionais.
Me faz lembrar relatos de colegas mais experientes, de quando a censura e a servidão ao governo faziam com que só pouquíssimos brasileiros tivessem acesso ao que acontecia de fato no país. Com exceção dos que recorriam aos jornais estrangeiros, que chegavam nos aviões e ficavam jogados em bancos dos aeroportos ou frequentando uma das agências da Varig. Hoje, quando se omitem ou minimizam, são desmascarados instantaneamente por comparação com os demais. Basta um clique.
Foi vergonhosa a cobrança que rolou na internet, chamando a atenção para o espaço reduzido e relativizante que os impressos nacionais dedicaram em contraponto com a ressonante cobertura de alguns estrangeiros, com destaque para a cobertura do britânico “The Guardian”. O mesmo aconteceu com as emissoras de televisão abertas, assim como as all news.
Estas mesmas que alteraram suas engessadas grades para transmitir os protestos raciais nos Estados Unidos em Tempo Real, praticamente viraram as costas (no caso as câmeras) para os protestos que aconteciam simultaneamente nas principais capitais do país. Essa realidade paralela mostrada por boa parte da imprensa nacional serviu de chacota para o jornal de humor “Sensacionalista”, além de memes e cobranças nas timelines de todas as mídias sociais.
Ou seja, os mesmos erros do passado, os quais já admitiram e pediram desculpas até em editoriais, continuam sendo cometidos. Não necessariamente pelos mesmos motivos. Hoje, já com a dependência menos da publicidade pública por conta de outras divergências posicionais e políticas, deduz-se que o comportamento seja muito mais pelo acovardamento diante dos ameaçadores seguidores.
Isso embora as pesquisas atuais mostrem que essa claque robotizada é infinitamente menor do que como tentam se mostrar. Porém, não resta a menor dúvida de que são muito intimidadores. As constantes interrupções de reportagens, gritarias, ameaças morais e físicas aos profissionais de imprensa e a #Lixo agregada aos nomes das tradicionais empresas, assustam mais do que a caneta vermelha do censor de outrora.
Presenciamos mais um triste capítulo na história da imprensa brasileira, que pode não ter como virar essa página tão facilmente. Afinal, achando-se acima do bem e do mal, esquecem a regra básica do mundo da reputação: construir ou resgatar uma marca pode demorar muito tempo, agora, para destruí-la, hoje em dia, basta um clique!
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Por Luiz André Ferreira, jornalista e professor universitário, Mestre em Bens Culturais e Projetos Socioambientais foi pioneiro com a Coluna “Responsabilidade.com” sobre sustentabilidade lançada em 2008 no Jornal francês Le Monde e hoje circulando de forma independente. Passagens pela Folha de SP. Jornal do Brasil e os grupos Estadão, Globo e Bandeirantes entre outros.
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