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Contra a desinformação, checadores de fatos mandam carta à CEO do YouTube

Contra a desinformação, checadores de fatos mandam carta à CEO do YouTube
A plataforma é amplamente utilizada por usuários para o compartilhamento de informações falsas. (Imagem: iStock).

Manifesto é assinado por mais de 80 organizações do mundo. Documento propõe cinco soluções para a plataforma de vídeos

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Organizações de checagem de fatos de todo o mundo se uniram com o objetivo de cobrar – e propor – medidas claras de combate à divulgação de informações falsas no YouTube. Em carta enviada à CEO da plataforma de vídeos, Susan Wojcicki, o grupo destaca que, principalmente durante a pandemia da Covid-19, usuários frequentemente utilizaram o site como um meio de divulgação de fake news. Entre as organizações que participaram do manifesto estão as brasileiras Lupa e Aos Fatos.

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Para resolver o problema apontado logo no início do manifesto, ao qual o Portal Comunique-se teve acesso, são sugeridas cinco ações que podem ser tomadas pelo YouTube para combater a desinformação nos conteúdos da plataforma: compromisso com a transparência sobre a desinformação na plataforma, fornecer contexto sobreposto aos vídeos que apresentem informações falsas ou como conteúdo de vídeo adicional, agir contra infratores reincidentes e ampliar esforços contra a desinformação em idiomas diferentes do inglês.

“É por isso que encorajamos você a tomar medidas eficazes contra a desinformação e os boatos na plataforma e a elaborar um roteiro de políticas e intervenções de produto para melhorar o ecossistema de informações – e a convidamos a fazer isso com as organizações de verificação de fatos independentes e apartidárias no mundo”, sugere a carta.

Veja, abaixo, o texto na íntegra:

Uma carta aberta dos verificadores de fatos à CEO do YouTube

12 de janeiro de 2022

Sra. Susan Wojcicki,

Já se passaram quase dois anos desde o início da pandemia de COVID-19. O mundo tem visto repetidamente como a desinformação e os boatos podem ser destrutivos para a harmonia social, a democracia e a saúde pública; muitas vidas e meios de subsistência foram arruinados, e muitas pessoas perderam entes queridos por causa da desinformação. Como uma rede internacional de organizações de verificação de fatos, monitoramos a disseminação de mentiras no ambiente digital – e, todos os dias, vemos que o YouTube é um dos principais canais de desinformação e boatos on-line em todo o mundo. Esta é uma grande preocupação para a nossa comunidade global de verificação de fatos.

O que não vemos é muito esforço do YouTube para implementar políticas que resolvam esse problema. Pelo contrário, o YouTube está permitindo que sua plataforma seja transformada em uma arma por infratores inescrupulosos, que a usam para manipular e explorar outros, além de se organizarem para arrecadar fundos. As ações atuais são insuficientes. É por isso que encorajamos você a tomar medidas eficazes contra a desinformação e os boatos na plataforma e a elaborar um roteiro de políticas e intervenções de produto para melhorar o ecossistema de informações – e a convidamos a fazer isso com as organizações de verificação de fatos independentes e apartidárias no mundo.

No ano passado, vimos grupos conspiracionistas prosperando e colaborando além das fronteiras, incluindo um movimento internacional que começou na Alemanha, foi para a Espanha e se espalhou pela América Latina, tudo no YouTube. Enquanto isso, milhões de outros usuários assistiam a vídeos em grego e árabe que os encorajaram a boicotar vacinações ou tratar suas infecções por COVID-19 com curas falsas. Além da COVID-19, os vídeos do YouTube vêm promovendo curas falsas para o câncer há anos.

No Brasil, a plataforma tem sido usada para amplificar o discurso de ódio contra grupos vulneráveis, atingindo dezenas de milhares de usuários. As eleições também não estão seguras. Nas Filipinas, conteúdos falsos com mais de 2 milhões de visualizações negam abusos de direitos humanos e corrupção durante os anos da lei marcial e estão sendo usados para polir a reputação do filho do falecido ditador, um dos candidatos nas eleições de 2022. Em Taiwan, assim como no Brasil, a última eleição foi marcada por acusações infundadas de fraude. O mundo inteiro testemunhou as consequências da desinformação quando uma turba violenta atacou o Capitólio americano no início de 2021. Desde a véspera da eleição presidencial dos Estados Unidos até o dia seguinte, os vídeos do YouTube que apoiavam a narrativa de “fraude” foram assistidos mais de 33 milhões de vezes.

São muitos exemplos. Muitos desses vídeos e canais permanecem on-line hoje, e todos eles passaram pelo radar das políticas do YouTube, especialmente em países do hemisfério sul que não falam inglês. Estamos felizes que a empresa tenha tido algumas iniciativas recentes para tentar resolver esse problema, mas, com base no que vemos diariamente na plataforma, avaliamos que esses esforços não estão funcionando – nem o YouTube produziu dados de qualidade para provar sua eficácia.

A plataforma, até agora, enquadrou as discussões sobre desinformação como uma falsa dicotomia entre excluir ou não excluir conteúdo. Ao fazer isso, o YouTube está evitando a possibilidade de fazer o que está provado que funciona: nossa experiência como verificadores de fatos, juntamente com evidências acadêmicas, nos diz que exibir informações verificadas é mais eficaz do que excluir conteúdo. Isso também preserva a liberdade de expressão, ao mesmo tempo em que reconhece a necessidade de informações adicionais para mitigar os riscos de danos à vida, saúde, segurança e processos democráticos. E visto que uma grande proporção de visualizações no YouTube vem de seu próprio algoritmo de recomendação, a plataforma também deve se certificar de que não esteja promovendo ativamente a desinformação entre seus usuários ou recomendando conteúdo proveniente de canais não confiáveis.

Com tudo isso em mente, propomos algumas soluções que fariam grande diferença para reduzir a disseminação de desinformação e boatos no YouTube.

  1. Um compromisso com a transparência sobre a desinformação na plataforma: O YouTube deve apoiar pesquisas independentes sobre as origens das diferentes campanhas de desinformação, seu alcance e seu impacto, e as formas mais eficazes de desmascarar informações falsas. Deve também publicar sua política de moderação completa em relação à desinformação e a boatos, incluindo o uso de inteligência artificial e quais dados a alimentam.
  2. Além de remover conteúdo para fins de conformidade legal, o foco do YouTube deve ser fornecer contexto e oferecer exposição, claramente sobrepostos aos vídeos ou como conteúdo de vídeo adicional. Isso só pode acontecer se houver uma colaboração significativa e estruturada entre os checadores de fatos e o YouTube, com a plataforma assumindo a responsabilidade e investindo sistematicamente em esforços independentes de verificação de fatos em todo o mundo.
  3. Agir contra infratores reincidentes que produzem conteúdo que é constantemente sinalizado como desinformação e boato, especialmente aqueles que monetizam esse conteúdo dentro e fora da plataforma, evitando que seus algoritmos de recomendação promovam conteúdo de tais fontes de desinformação.
  4. Ampliar esforços atuais e futuros contra a desinformação e boatos em idiomas diferentes do inglês e fornecer dados específicos do país e do idioma, bem como serviços de transcrição que funcionem em qualquer idioma.

Esperamos que você considere a implementação dessas ideias para o bem público e para fazer do YouTube uma plataforma que realmente dê o seu melhor para evitar que a desinformação e os boatos sejam usados como arma contra seus usuários e a sociedade em geral. Estamos prontos e disponíveis para ajudar o YouTube. Gostaríamos de marcar uma reunião com você para discutir esses assuntos e encontrar caminhos para uma colaboração e aguardamos sua resposta a esta oferta.

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Julia Renó

Jornalista. Natural de São José dos Campos (SP), onde vive atualmente, após temporadas em Campo Grande (MS). Formada pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (MS) e voluntária da ONG Fraternidade sem Fronteiras, integrou o time de jornalistas do Grupo Comunique-se de julho de 2020 a abril de 2022.

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