“Discordo politicamente do Chico Buarque, agora o reconheço como um brilhante músico, brilhante letrista”. “[Ele é brilhante] como dramaturgo também, lembrar de Roda Viva, Calabar, Ópera do Malandro e por aí vai”. “Reconheço o seu brilhantismo e que muitos tentaram desqualificar por questões políticas. Dizendo, inclusive, que todas as composições dele eram falsas”. “Desde os festivais da Record nos anos 60, o brilhantismo, a produção em momentos difíceis, de censura, ele sempre fez e tem uma obra importantíssima”. “As músicas dele marcaram a minha vida”.
Essas foram algumas das frases proferidas por Marco Antonio Villa na edição de 22 de maio do ‘Jornal da Manhã’, da Jovem Pan. Então comentarista do noticiário radiofônico, o historiador encheu de elogios o cantor e compositor brasileiro Chico Buarque de Hollanda, que venceu a última edição do Prêmio Camões de Literatura. Dois dias depois, o professor fez — ao que tudo indica — sua última participação na JP. Isso porque ele foi comunicado de seu afastamento pelo vice-presidente e ex-diretor de jornalismo da emissora, José Carlos Pereira, conforme disse a Gilvan Marques, repórter do UOL.
Desde que o imbróglio envolvendo Marco Antonio Villa foi divulgado, uma série de versões se proliferou na imprensa e nas redes sociais. Alguns sites chegaram a afirmar que o comentarista deixou o ‘Jornal da Manhã’ porque a direção da Jovem Pan teria acatado pedido do presidente Jair Bolsonaro. Num primeiro momento, a emissora garantiu que o comentarista teria apenas saído de férias. A afirmação por parte do veículo de mídia foi desmentida pelo próprio historiador, que pontuou não ter acertado nenhum período de descanso. Posteriormente, a emissora trocou de postura. Sugeriu que a saída de Villa — ainda oficialmente temporária — estaria relacionada a “adjetivação grosseira”, como pontuou Joaquim de Carvalho no DCM.
As duas versões disseminadas pela Jovem Pan são falsas. Apuração da reportagem do Portal Comunique-se aponta, com exclusividade, que Marco Antonio Villa não foi afastado por fazer uso de “adjetivação grosseira”, não saiu de férias e nem teve a cabeça pedida por Bolsonaro. Aliás, não foi uma crítica que culminou na decisão da emissora. Elogios a alguém considerado “esquerdista” por integrantes da alta cúpula da empresa provocou a situação. O comentarista saiu do ar por causa dos termos laudatórios usados para falar da importância de Chico Buarque para a cultura brasileira. Comentários esses ressaltados no início deste texto.
Dois profissionais da Jovem Pan validam que o afastamento de Marco Antonio Villa está relacionado aos elogios feitos a Chico Buarque. “Se o problema fosse o tom crítico do professor, a decisão seria tomada há anos, quando ele já vinha sendo ácido com Bolsonaro, com outros políticos e até com integrantes do STF”, comenta um funcionário da rádio que, com medo de sofrer represálias (quem sabe podendo ser até afastado), solicita para não ter o seu nome divulgado pela reportagem. “O problema aqui tem sido elogiar, não criticar. Vale lembrar o que aconteceu com o Kajuru ano passado”, pontua outro colaborador da emissora, que também pede para ter a sua identidade preservada.
A frase dita por uma das fontes contatadas pelo Portal Comunique-se remete a outro episódio envolvendo afastamento de alguém dos microfones da Jovem Pan. Em junho de 2018, o então apresentador do ‘Ligado na Cidade’, Fernando “Kajuru” Martins, mandou beijos para o apresentador Ronnie Von e para o pianista Caçulinha. O comunicador, hoje fora de vez da emissora, chegou a ser afastado da função, conforme informou na ocasião o colunista Flávio Ricco. Em relação a Villa, até por ter ocorrido dois dias depois, os elogios a Chico Buarque não foram observados de imediato como razão pelo afastamento decidido pela casa.
Afastado do ‘Jornal da Manhã’ da Jovem Pan, mas não da função de analista político. Desde que deixou de atuar diariamente na rádio, Marco Antonio Villa tem investido em produção de vídeos para seu canal no YouTube. Boa parte dos conteúdos é divulgada por volta das 8h, horário em que o noticiário da JP é transmitido no dial e nas redes sociais da emissora. Nos últimos materiais, questionou onde estaria o Partido dos Trabalhadores e qual seria a agenda econômica defendida por Jair Bolsonaro. Dessa forma, o professor e historiador tem ido de comentarista contratado a concorrente — na disputa por views na plataforma de vídeos do Google — da Jovem Pan.
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