O correspondente paraguaio Cándido Figueredo, que trabalha na cidade de Pedro Juan Caballero, na fronteira com o Brasil, diz que a situação na região está “muito tensa” após o assassinato do jornalista brasileiro Lourenço Veras, conhecido como Léo Veras, em 12 de fevereiro. “Há rumores de que o PCC [a facção criminosa Primeiro Comando da Capital] estaria planejando ataques contra outros jornalistas. Então estamos tomando muito cuidado”, disse ele, em entrevista ao Knight Center for Journalism in the Americas.
Léo Veras era responsável pelo site Porã News. Ele foi assassinado na sua casa, enquanto jantava com a família, em Pedro Juan Caballero, cidade paraguaia que faz fronteira com a brasileira Ponta Porã (MS). Cándido Figueredo disse que está muito abalado com a morte do amigo, com quem conversava diariamente. Correspondente do maior jornal do Paraguai, o ABC Color, Figueredo vive com escolta policial há quase 25 anos após numerosos atentados e ameaças contra a sua vida.
O correspondente afirma que a região ficou “muito mais perigosa” nos últimos anos, com o avanço do PCC. “Eles implementam o seu poder na base do medo (…) Acho que agora eles estão pressionando [os jornalistas] para que a gente não publique muitas coisas sobre eles”, afirmou.
Cándido Figueredo tem coberto o caso do assassinato de Léo Veras para o ABC Color desde o primeiro dia. “É muito difícil escrever quando a vítima é um amigo”, afirma ele, para quem a cobertura ajuda a cobrar das autoridades uma solução para o caso. O jornalista denuncia que, até agora, não houve nenhum avanço na investigação.
Como você descreveria o clima entre os jornalistas na região após o assassinato de Léo Veras
A situação está muito tensa, estamos muito abalados com o que aconteceu. Ainda mais porque há rumores de que o PCC estaria planejando ataques contra outros jornalistas. Estamos tomando muito cuidado. Tanto eu quanto o Léo temos muitos informantes nesse submundo, além de policiais.
O senhor ainda tem a escolta?
Sim, eu e a minha esposa temos escolta policial há 25 anos. Ela tem três policiais mulheres que fazem a segurança dela. No total, são sete policiais para nós dois.
O senhor acha que a região ficou mais perigosa desde a última vez que nos falamos, em 2016?
Muito mais perigosa, muito mais perigosa. Nós agora estamos à mercê do PCC e do Comando Vermelho. Mais do PCC, que já tomou conta de tudo. Acredito que o PCC já tenha gente em todas as cidades fronteiriças do Paraguai com o Brasil e até na capital, em Assunção.
Eles monopolizaram tudo que é relacionado ao tráfico de drogas, de armas e lavagem de dinheiro. Eles tiraram todos os traficantes paraguaios. Agora, todos são membros do PCC, e os paraguaios que estão aí são apenas soldados deles. Eles implementam o seu poder na base do medo. Por isso, eles repassam esses vídeos em que eles cortam a cabeça e corpos das pessoas que estão contra eles. Acho que agora eles estão pressionando [os jornalistas] para que a gente não publique muitas coisas sobre eles.
E o senhor conhecia bem o Léo Veras?
Claro, ele trabalhou comigo para o ABC Color por seis meses em 2017, e eu falava com ele quase todo dia. A gente sempre trocava informações. Quando acontecia alguma coisa em Ponta Porã, ele me ligava, me avisava, mandava fotos e dados do lado brasileiro. E eu também muitas vezes passava as informações do que acontecia na fronteira. Ponta Porã e Pedro Juan Caballero estão dividas por uma rua só. Nós [do ABC Color] publicamos algo que acontece no Brasil se tiver relação com algum cidadão paraguaio. Mas o Léo Veras tinha uma página digital sobre a fronteira, então ele publicava notícia das duas cidades.
Como ele era como jornalista e amigo?
Ele era um jornalista inquieto, andava atrás da notícia, não interessava o tempo, a distância. Era um cara alegre, que não era de falar muito, mas um cara legal.
E o senhor tem feito a cobertura do caso, não é?
Sim, estou cobrindo desde o primeiro dia. Na noite em que ele foi morto, já de imediato fiz a matéria que saiu na página digital do jornal. E no dia seguinte eu fiz uma cobertura ampla sobre o que aconteceu. Depois, no enterro, também fiz uma matéria. É muito difícil escrever quando a vítima é um amigo, que trabalhou muito tempo conosco na redação do jornal. É muito difícil, mas a gente tem que fazer. Apesar de tudo isso, nós seguimos trabalhando, porque se ficássemos calados seria bem melhor para as autoridades judiciais.
Como o senhor avalia a investigação do caso?
Sobre a investigação, eu também escrevi que até hoje não tem nada. O Ministério Público diz que está fazendo a investigação e que tudo está sendo feito em segredo. Até hoje eles não falaram nada de concreto sobre que grupo poderia ter feito esse atentado. A gente está trabalhando, insistindo e, assim que tiver alguma novidade, vamos publicar.
O senhor tem conversado com outros jornalistas da região sobre alguma medida coletiva?
Não tenho muito contato com ninguém. Não falo com nenhum outro jornalista, não me reúno com ninguém. Sou um lobo solitário. A melhor forma de se cuidar na fronteira é não confiar em ninguém. Eu falava muito com o Léo Veras, porque ele sempre trabalhou comigo de perto, então a gente conversava muito.
O senhor está pensando em sair daí agora que a situação está mais tensa?
Ainda não decidimos nada. Estamos estudando a situação [eu e a minha esposa]. A situação está muito quente ainda, e a gente tem que pensar de cabeça fria. Vamos esperar uns dias e analisar. Estou acostumado, já metralharam a minha casa duas vezes, já metralharam o carro em que eu estava duas vezes, já recebi um monte de ameaças. Então, eu já não reajo dessa forma. Claro que quando um amigo teu é assassinado… mas temos que pensar com cabeça fria no que fazer.
Tem alguma entidade que esteja acompanhando isso de perto?
Aqui não tem nenhuma entidade que possa ajudar os jornalistas. Só tem em Assunção, mas as pessoas da capital não têm noção de como é a vida aqui na fronteira. É difícil. Cada um está se virando como pode.
Os jornalistas aí na fronteira ficam meio abandonados…
É, sempre é assim.
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