O Congresso Nacional tem um órgão específico para tratar de assuntos relacionados à comunicação e a liberdade de imprensa, o Conselho de Comunicação Social (CCS). Criado em 1991, o conselho, no entanto, está suspenso por conta da pandemia. Seus integrantes foram eleitos em março de 2020, mas até agora não tomaram posse.
A importância do funcionamento do grupo tem sido apontada por senadores e entidades de defesa das liberdades de imprensa e de expressão. Oito dessas representações apresentaram carta ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, solicitando o compromisso das lideranças políticas com a liberdade de imprensa e a segurança de jornalistas e comunicadores do país.
Para eles, a discussão e análise desses temas no âmbito do Conselho de Comunicação Social seria uma sinalização positiva dos congressistas já que existem hoje quase 40 proposições em tramitação no Senado e na Câmara dos Deputados com foco em imprensa, acesso à informação, trabalho jornalístico e liberdade de expressão. O documento foi entregue a Pacheco em 7 de abril, justamente no Dia do Jornalista.
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), que também é jornalista, reforçou o pedido para que os novos membros do conselho tomem posse. No dia 3 de maio, quando foi celebrado o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, a senadora disse, em suas redes sociais, que o Brasil enfrenta um cenário preocupante de crescentes ameaças e ataques a jornalistas e restrições à liberdade de imprensa, com um ambiente cada vez mais hostil para o exercício da profissão além de mudanças e precarização das atividades jornalísticas.
“O Senado faria um grande gesto dando posse aos novos membros do Conselho de Comunicação Social, eleitos pelo Congresso em 2020. Segundo a Constituição, a sua principal prerrogativa é cuidar da liberdade de imprensa”, ressaltou a senadora no Twitter.
A mesma opinião tem a líder da bancada feminina, senadora Simone Tebet (MDB-MS). Ela acredita que após um ano de paralisação das atividades presenciais das comissões e órgãos do Parlamento, o conselho pode ser reativado, mesmo que em caráter remoto.
“É o momento agora de se imaginar um retorno semipresencial. As comissões, as principais, principalmente do Senado, tem que estar sim, de portas abertas, da mesma forma o conselho […] Através do Conselho e depois através da nossa fala nas comissões e no Plenário, poder não só denunciar, mas também, fruto dessa análise do conselho, apresentar propostas legislativas para aprimorar não só a legislação mas também a punição a quem quer que seja que, de forma leviana, muitas vezes na tentativa oculta do anonimato, ameaça essa profissão que é uma profissão tão importante para a democracia” disse em entrevista à Agência Senado.
O senador Angelo Coronel (PSD-BA), presidente da CPI Mista das Fake News, espera que as atividades sejam retomadas com brevidade permitindo que o grupo continue os estudos e pareceres com recomendações de “ações diretas que visem conter ameaças a essa liberdade”.
“Por isso é importante que os membros do conselho estejam sempre atentos aos movimentos que se verifiquem no meio da sociedade, a fim de, com celeridade, poder recomendar as ações necessárias. Daí que não se pode negar o prejuízo causado pela demora na posse dos atuais membros do conselho. São compreensíveis, até certo ponto, as dificuldades provocadas pela pandemia. Todavia, nos parece possível que o conselho possa se reunir de forma remota”, observou à Agência Senado.
Para o senador Jorge Kajuru (Podemos-GO), jornalista há mais de 40 anos, o fortalecimento do conselho vai oferecer condições técnicas ao Parlamento para avançar nas medidas que ampliem garantias e seguranças aos profissionais de imprensa no exercício da profissão.
“Acredito que esse conselho, assim que abrandar a pandemia do novo coronavírus, tem a obrigação de promover um grande seminário sobre a situação da imprensa no país. Todos os envolvidos na questão devem ser chamados para discutir como fortalecer o jornalismo e proteger os profissionais do setor, sobretudo fora dos grandes centros urbanos. Isso a partir de uma perspectiva bem objetiva: quanto mais tivermos liberdade de imprensa, menos sujeitos estaremos às ações de líderes autoritários”, ressaltou.
Os nomes dos 13 titulares e 13 suplentes para a composição de um novo mandato de dois anos foram aprovados pelos congressistas em março do ano passado. Com a paralisação dos trabalhos de comissões e conselhos do Congresso Nacional, as atividades ficaram suspensas e o grupo não chegou a ser empossado. Mas de acordo com o jornalista e membro titular do grupo Davi Emerich há “muita expectativa em relação ao início das atividades”.
Reconduzido como representante da sociedade civil ao conselho, Davi ressalta que, a rigor, o Congresso ainda não compreendeu bem o papel do CCS. Na sua avaliação, juntamente com outras representações e demais Poderes da República, o grupo pode colaborar jogando “luz nos debates” e apresentando sugestões consensuais sobre temas complexos já que privilegia estudos, rigores técnico e conceitual.
Entre essas discussões, ele cita mudanças no setor de comunicação com a introdução de novas plataformas e a questão da disseminação de notícias falsas por meio das redes sociais.
“Há uma revolução tecnológica em todo o mundo. Com isso, as mídias tradicionais passaram a enfrentar uma grande crise de modelo, com impacto na vida dos profissionais e no exercício da própria liberdade de imprensa. Não se pode deixar que o mercado resolva esse problema sozinho, o resultado seria desastroso. O poder público e o Congresso jogam papel importante na modelagem de transição”, observou em entrevista à Agência Senado.
“Não se pode naturalizar tudo e achar que as grandes plataformas e as redes sociais sejam a última palavra nesse mundo imenso da comunicação. Se ficam sozinhas, as fakes news prosperam, a manipulação da informação ganha corpo para gerar a monetização. A velocidade da notícia e o seu empilhamento mecânico agridem a capacidade do raciocínio crítico e a ideia da verdade construída a partir do livre fluxo da informação se esvai”, completou.
Previsto na Constituição de 1988 e instituído em 1991, o CCS começou a funcionar efetivamente em 2002, quando o primeiro grupo foi empossado e teve suas atividades iniciadas. O órgão concentra indicações da sociedade civil, representantes das empresas de rádio, televisão, imprensa escrita, engenheiros com notórios conhecimentos na área de comunicação social e representantes das categorias profissionais dos jornalistas, radialistas, artistas e profissionais de cinema e vídeo.
Entre as suas atribuições, está a de realizar estudos, pareceres e outras solicitações encaminhadas pelos parlamentares sobre liberdade de expressão, monopólio e oligopólio dos meios de comunicação, programação das emissoras de rádio e TV, uso de novas plataformas digitais, divulgação de imagens e informações em veículos de mídia e redes sociais, entre outros.
De 2002 até o final de 2019, cinco grupos foram eleitos, empossados e ficaram responsáveis por discussões e emissão de pareceres sobre temas como concentração da mídia, TV digital, TV por assinatura e convergência dos meios de comunicação.
Os integrantes do conselho são eleitos por senadores e deputados federais, a partir de sugestões de entidades representativas dos setores da comunicação social e da sociedade civil, em sessão conjunta do Congresso Nacional. A votação é por maioria simples, com a chapa composta pelos nomes sugeridos pelas entidades.
A última reunião do grupo, ainda com a composição anterior, foi no dia 4 de novembro de 2019. Na ocasião, os conselheiros apresentaram um estudo sobre liberdade de imprensa no Brasil, a pedido da senadora Eliziane Gama, e discutiram o Projeto de Lei (PL) 3.832/2019, do senador Vanderlan Cardoso (PP-GO), que altera a Lei do Serviço de Acesso Condicionado (SeAC) ou Lei da TV Paga (Lei 12.485, de 2011). O projeto, em tramitação no Senado, permite que a empresa que distribui os canais de televisão seja a mesma que produz o conteúdo. Além disso, os membros apresentaram um relatório de atividades encerrando o mandato da última composição que esteve em atuação e era presidida por Murillo de Aragão e tinha como vice-presidente Marcelo Cordeiro.
Conforme o relatório apresentado, o grupo realizou 24 reuniões e seis audiências públicas que abordaram temas como fake news, violência contra profissionais de comunicação, a questão das rádios comunitárias e a situação da liberdade de imprensa no Brasil.
Os membros também fizeram levantamento de 241 matérias legislativas em tramitação na Câmara dos Deputados e outras 62 que estão no Senado e que abordam temas relacionados à imprensa e aos meios de comunicação. Algumas dessas matérias foram selecionadas, relatadas e tiveram pareceres emitidos com estudo e recomendação endereçados ao presidente do Congresso Nacional e aos autores e relatores de cada projeto de lei.
A última composição do CCS também atualizou o Regimento Interno do Conselho, em vigor desde 2013. Entre as mudanças, aprovou recomendação para que seja incluído um relato mensal sobre casos de violência contra empresas e profissionais de comunicação nas reuniões ordinárias do colegiado e ampliou a área de atuação do grupo. Antes era permitido que os conselheiros discutissem temas previstos na legislação sobre TV a cabo (leis 8.977, de 1995, e 12.485, de 2011). A alteração estendeu essa competência para a internet autorizando os membros a discutir assuntos tratados no Marco Civil do setor (lei 12.965, de 2014).
“O conselho debateu e exarou pareceres que ajudaram na montagem do Marco Civil da Internet, sempre se manifestou a favor da liberdade de imprensa e sem tergiversações, esteve muito presente no debate acerca das rádios comunitárias e também na questão da transformação das rádios AM em FM. Realizou seminários sobre publicidade e acompanhou de perto vários projetos sobre fake news. Destaque também para um estudo sobre liberdade de imprensa, solicitado pela senadora Eliziane Gama”, ressaltou Davi.
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