Com duas décadas e meia de trabalho em minha legendária carreira de revisor de textos, a maior parte desse tempo atuando como autônomo e corrigindo legendas de vídeo, transcrições de áudio, textos jornalísticos e trabalhos acadêmicos, perdi a conta do número de clientes para os quais já prestei serviços, mas eu teria perdido muito mais se a maioria das pessoas que precisam do trabalho de um revisor não fechasse suas portas para quem não tem formação escolar de nível superior.
Só vejo duas boas razões para o dono de uma oferta de trabalho para revisor de textos não contratar uma pessoa com um bom domínio de gramática sem ter cursado uma faculdade, principalmente de Letras: achar que todos os bons revisores saíram de uma instituição de ensino de nível superior (aliás, quem foi que disse, Berenice, que o estudo de gramática começa e termina na faculdade, não se estende por toda a vida de quem, dentro ou fora da escola, estuda essa matéria?) ou exigir a formação superior apenas para evitar ou diminuir o excesso de candidatos.
Não tenho dúvida de que, dependendo da faculdade pela qual eu tivesse passado, poderia até ter alguma lição de gramática que não havia tido em meus oito primeiros anos de escola, mas quem melhor para falar, bem ou mal, de meu trabalho do que as pessoas para as quais prestei ou presto serviços?
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Mas não adiantou eu me preocupar com meu autodidatismo – cada um com seus problemas –, porque quem nasceu para ser revisor vai ser, mesmo sabendo que vai encarar textos ininteligíveis ou cheios de dúvidas, ambiente barulhento, falta de eletricidade ou de conexão com a internet, madrugadas, fins de semana, feriados, prazos curtos para entregar o trabalho, atrasos no pagamento ou calotes e ser privado de ir a festas.
Eu nem sonhava no que iria ser quando crescesse quando a vida começou a me preparar para encarar o espinhoso campo da revisão de textos.
Primeiro, apresentando-me uma empoeirada edição de “Gramática Metódica da Língua Portuguesa”, do professor Napoleão Mendes de Almeida, que, achando que iria ser jogada no lixo ou virar comida de traças, acabei não só surrupiando da biblioteca da escola onde estudei do primeiro ao oitavo anos do ginásio, mas também tendo como uma das mais estudadas e consultadas bíblias da língua portuguesa.
Mas, até fazer-me correr atrás do trabalho para o qual nasci para fazer – revisar textos –, a vida me mandou carregar e descarregar carrinhos de lenha em uma padaria, abrir e fechar cancelas na portaria do depósito de uma rede de comércio varejista, vender livros em um sebo, atender clientes em uma loja de conveniência e, aproveitando minha paixão pelo jornalismo, área na qual gostaria de atuar se eu não tivesse me tornado revisor, ler os manuais de redação estilo dos principais jornais do país, como o “Manual de Redação e Estilo”, do jornal “O Estado de S. Paulo”, e o “Manual da Redação”, da “Folha de S.Paulo”.