Notícias falsas existem desde antes o jornalismo sequer existir enquanto profissão organizada. Primeiro, elas eram disseminadas oralmente. Ao mesmo tempo em que Johannes Gutenberg inventou a prensa móvel, em 1439, as chamadas fake news viveram o seu primeiro “boom“. Hoje, desinformação flui principalmente pela internet. Então, sejamos francos: os atos de mentir e induzir pessoas ao erro tem pouco a ver com o jornalismo de forma direta.
Claro, a mídia tem sua parcela de culpa no cenário atual: por exemplo, a distância entre jornais e audiência, a inabilidade de se adaptar a novas tecnologias e o sensacionalismo não fizeram nada senão ajudar a acelerar a disseminação de notícias falsas. O “jornalismo amarelo” da década de 1890, nos Estados Unidos, foi uma das grandes inspirações para pessoas passarem a mentir em forma de notícias.
Porém, a maior batalha que temos enquanto sociedade não é com tweets falsos ou textos que se autointitulam reportagens. É contra a natureza humana.
O primeiro obstáculo evidente nessa luta é o que se conhece como viés de confirmação. De acordo com um estudo conjunto, conduzido por pesquisadores das universidades da Flórida, Illinois at Urbana-Champaign, Northwestern e Ohio, pessoas são duas vezes mais propensas a selecionar informações que reforcem crenças já consolidadas do que argumentos que as contradigam. No fim das contas, o ser humano simplesmente não está aberto a mudar de opinião.
A segunda variável dessa equação é puro ego. No livro Uma história das notícias (A History of News, no original), o autor Mitchell Stephens, professor de jornalismo da Universidade de Nova York, explica que o ato de contar uma notícia a alguém traz consigo o que o especialista chama de “gratificação do ego”. Esse sentimento positivo varia desde a sensação de status por ser uma pessoa mais bem informada em um círculo social até tornar-se o centro das atenções de um grupo. Essa é uma das razões pelas quais as redes sociais são o principal veículo de propagação de fake news: qualquer um tem a oportunidade de se imaginar como alguém se prestando a um bem maior, nem que seja por meio de uma mentira.
Ambos os problemas não nasceram por causa do jornalismo (embora, como disse, tenhamos nossa parcela de culpa). Mudar comportamentos enraizados por séculos na essência humana é uma tarefa complicada – para não dizer quase impossível – e para além do alcance de jornalistas.
Por exemplo, uma pesquisa publicada pela revista Science mostrou que postagens falsas se difundem significativamente de forma mais rápida, chegam mais longe e têm maior alcance do que notícias verdadeiras no Twitter. Outro estudo sobre a mesma plataforma indica que o engajamento com fake news varia entre quatro e seis milhões por mês. Na eleição americana de 2016, a interação com informações falsas esteve no mesmo patamar de reportagens escritas por jornalistas.
Claramente, a quantidade de conteúdo falso circulando e a velocidade com que ela é compartilhada são mais do que o jornalismo – uma profissão que vê cada vez mais demissões – pode suportar. Porém, isso não significa que nós não podemos ajudar. Pelo contrário, iniciativas muito boas estão sendo colocadas em prática mundo afora.
O projeto Comprova, iniciativa de brasileira de fact-checking, é vista mundialmente como case de sucesso. Ele consiste em um grupo de 24 redações que analisam fake news – muitas delas enviadas por leitores para checagem – e investigam se são verdadeiras ou não. O Comprova, então, define cada informação como “Enganosa”, “Falsa”, “Sátira” ou “Comprovada”.
Durante as eleições de 2018, o Comprova conseguiu checar 147 notícias. Um feito impressionante que não se restringiu ao período eleitoral, uma vez que segue ativo até hoje. Ao mesmo tempo, porém, esse esforço contra fake news se mostra largamente insuficiente: o Comprova recebia cerca de duas mil potenciais informações falsas por dia, enquanto foi capaz de analisar menos de 200.
Mesmo com um cenário penoso pela frente, ainda é possível ver um caminho por onde podemos trilhar para diminuir a proliferação de fake news. E tudo começa por aceitar que o jornalismo tem ganhado novos papeis que vão além do simples informar – e chamar outros players para lutar contra a desinformação.
As plataformas de redes sociais têm uma enorme responsabilidade aqui. Com uma dose de atraso e pressão da opinião pública, Facebook, Twitter e WhatsApp iniciaram parcerias com agências de fact-checking e empresas jornalísticas para identificar postagens falsas nas suas plataformas. O WhatsApp tem banido usuários com histórico de compartilhar fake news; o Twitter travou uma guerra contra bots e o Facebook cortou pela metade as interações com esse tipo de conteúdo desde a eleição de 2016. As três ainda têm muito a melhorar – incluindo estreitar relações com as redações -, mas essa parceria é fundamental para diminuirmos a influência de conteúdo falso sobre cidadãos.
Na minha visão, entretanto, o passo crucial nessa batalha ainda levará alguns anos para se tornar realidade: educação. E o jornalismo, novamente, pode contribuir com a sociedade de modo mais profundo do que apenas reportar e checar fatos. Podemos ajudar pessoas, desde a infância, não apenas a diferenciar informações mentirosas de verdadeiras, mas ensiná-las a importância de checar antes de compartilhar algum post. São só exemplos, e tenho certeza que outros jornalistas trarão ainda mais outras ideias à tona.
Dessa forma, a sociedade pode começar a construir um ambiente mais confiável para as próximas gerações fortalecerem a democracia e tomarem melhores decisões nas suas vidas.
Todo esforço será suficiente para vencer as fake news? Acho difícil. Pessoas seguirão escolhendo aquilo que melhor se encaixa nas suas crenças, em maior ou menor intensidade. Elas ainda vão querer se sentir parte de algo maior ao disseminar notícias, independentemente de serem falsas ou não. Temos de aceitar isso. O que não significa que o jornalismo não possa ser um pioneiro nessa luta. O jornalismo não vai vencer essa guerra, mas está nas nossas mãos também não perdê-la.
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Por Caio Colagrande. Jornalista e mestrando em inovação digital no jornalismo pela Concordia University, de Montreal (Canadá). Passou pelas redações do Diário de S. Paulo e iG. Atualmente, é editor do portal E-Commerce Brasil.
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