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Por que o Google está investindo dinheiro em jornalismo e como se beneficiar

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O programa Google News Initiative distribuiu US$ 26 milhões em financiamento para redações da América Latina desde 2018. A finalidade é, entre outras coisas, ajudar o jornalismo a encontrar um caminho na era digital.

Entenda por encontrar um caminho a redefinição do modelo de negócios para que fique mais adequado ao mundo digital muito diferente daquele que conhecíamos poucos anos atrás, quando a mídia online eram uma mera figurante. Encontrar um caminho pode significar, ainda, um socorro a redações, que em meados deste ano, quando a pandemia chacoalhou a vida literalmente do mundo inteiro, penavam para pagar as contas. Muitas ainda penam.

Até agora, a Google News Initiative (ou simplemente GNI), que é um programa global, já apoiou 1.190 organizações jornalísticas na América Latina. Os detalhes estão no site do programa: http://g.co/gnidigitalgrowth/.

Não vou neste post me ater apenas às informações que você encontra nos mesmos releases que o próprio Google emplacou nos veículos de comunicação. Não que elas não sejam relevantes. Mas fomos além. Na edição #270 do Podcast-se, conversei com Marco Túlio Pires, diretor do Google News Lab no Brasil, que fala com propriedade da GNI. Se estiver com tempo, ouça o papo na íntegra no player abaixo (tem 51 minutos de duração) ou siga o Podcast-se em agregadores como SpotifyApple PodcastsGoogle Podcasts ou outro de sua preferência.

De qualquer forma, nos parágrafos a seguir, trago alguns insights da conversa.

O problema do jornalismo é o modelo de negócios, que ficou obsoleto nesta era digital.

O jornalismo viveu uma grande bonança nos anos 1980 e 1990 e tomou uma chacoalhada a partir dos anos 2000. Até ali, o jornalismo ainda se relacionava bem com a internet. Mas foi na década de 2010 que houve a consolidação de um novo modelos de negócios.

Empresas vendendo publicidade para exibir nos intervalos comerciais dos programas de massa perderam força, como você provavelmente já se cansou de saber. Nessa pequena revolução do mercado, surgiram veículos de comunicação com um modelo novo, como Nexo, Congresso em Foco, AzMina e vários outros. Eles aprenderam a fazer dinheiro seguindo uma outra lógica, muito diferente das grandes campanhas centralizadas nos grandes veículos de comunicação. Anúncios programáticos, native advertising e conteúdo premium são apenas três de muitas fontes de receita que os veículos tradicionais custaram a entender como funciona — se é que alguns já entenderam.

“O Google, então, chega para esses veículos e diz: você vai ter um recurso garantido por um ano para poder experimentar um novo modelo de negócios. O único desafio que nós colocamos é que é preciso ter um novo produto jornalístico. Com isso, conseguimos colocar as redações num novo modelo mental de experimentação, algo que antes não era possível”, explica Túlio — as pessoas o chamam mais pelo nome do meio.

Alguns frutos já começam a ser colhidos. Um exemplo, é o Radar aos Fatos, que é fruto desse programa. Segundo o aplicativo Rank Brain, o Radar aos Fatos tem média mensal de 625 mil visitas mensais. Não é pouco.

Resumindo com as minhas palavras — e não as do Túlio —, os jornalistas com a mentalidade da velha guarda não têm lá muito tino para negócios digitais. Eles precisavam que alguém os pegasse pelas mãos e os guiasse por um caminho mais moderno nesse mundo mais internético, onde o dinheiro não vem mais do lobby com as agências acostumadas a ganhar Leões em Cannes.

O dinheiro vem de um conjunto de habilidades digitais, que têm uma agravante: elas mudam rapidamente. Não é apenas uma questão de aprender as ferramentas. É uma questão de desenvolver uma nova cultura.

E aí vem a primeira pergunta: qual a melhor empresa no mundo para pegar os jornalistas pelas mãos e conduzi-los por essa jornada? O Google.

Isto nos leva à segunda pergunta: o que o Google ganha com isso?

É missão e business ao mesmo tempo

Vá até a página About Google que você vai encontrar de cara a missão da empresa em letras coloridas e garrafais.

Missão do Google

A GNI ajuda a cumprir essa missão. “É um esforço do Google para centralizar todas as iniciativas da empresa relacionadas ao jornalismo e melhor atender aos jornalistas porque eles já utilizam a nossa ferramenta, sendo ela concebida para jornalistas ou não”, resume Túlio.

Em outras palavras, o Google tem um compromisso com a sustentabilidade do jornalismo, que é a grande questão.

A linha de raciocínio, então, é a seguinte:

  1. O Google defende que a web seja aberta, livre, para que todas as pessoas possam acessá-la.
  2. Os jornalistas são parte fundamental do processo de troca de informação numa web aberta e livre. Afinal, liberdade de expressão é base do jornalismo. Quanto mais forte o jornalismo, mais livre e aberta é a web.
  3. Fazendo o raciocínio inverso, se a web não for plenamente livre e aberta, as pessoas podem parar de usar a máquina do Google e as suas ferramentas, que é de onde vem a sua receita.

“Existe, portanto, um interesse não só do ponto de vista de missão, mas também um interesse do ponto de vista de business mesmo”, resume Túlio.

Como se beneficiar?

Existem duas oportunidades para você, jornalista, na GNI.

Uma são treinamentos voltados para profissionais. Já passaram pelas aulas presenciais mais de 72.500 jornalistas. E pelos treinamentos online, foram mais 178.300. Isso só na América Latina, com dados atualizados em novembro de 2020.

Há uma página de cursos online (em inglês) disponíveis no formato self-service recomendados pelo Túlio: https://journalismcourses.org/. A própria página da GNI (http://g.co/gnidigitalgrowth/) também tem informações.

Nesse mesmo site, surgem informações que beneficiam redações com investimentos financeiros sempre que programas dessa natureza se abrem. Existem diferentes programas, e qualquer empresa de qualquer porte pode se inscrever. Por exemplo, o Desafio de Inovação, é um desses programas. Os critérios de escolha são técnicos. No podcast, o Túlio deixou uma dica valiosa.

“Pense na sua organização na era digital. O Google tem pouco interesse em repetir modelos que já foram testados e não estão funcionando. Nós recebemos inscrições de gente querendo fazer, por exemplo, um ensaio de fotos, a impressão de um livro ou o projeto editorial de reportagens. Não estamos procurando o conteúdo em si. Estamos interessados em mudar o pensamento da organização.”

Se eu disser que a questão é mudar o mindset, vão dizer que isto é papo de coach. Então, mudar a mentalidade é a proposta do Google.

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Cassio Politi

Já foi editor e diretor de conteúdo do Comunique-se, além de ombudsman do Portal. Atualmente, dirige os cursos do C-se e é o responsável pelo Podcast-se, que figura entre os top-10 podcasts de marketing do País de acordo com o Chartable. Escreveu o primeiro livro em português sobre content marketing. Em 2015, foi eleito pela Digitalks o profissional do ano em content marketing no Brasil. É, desde 2014, o único brasileiro a compor o seleto júri do Content Marketing Awards, o principal prêmio do mundo na categoria. Por sua empresa, a Tracto, presta consultoria ou produz conteúdo para empresas de variados portes no Brasil e na América Latina, incluindo multinacionais. Apresentou alguns de seus cases em eventos nos Estados Unidos. Está no Hall da Fama do Content Marketing World, em Cleveland, do qual participa anualmente desde 2012.

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